O sussurro cessou e ele compreendeu claramente que a sua própria alma tinha pecado por pensamentos e por palavras e obras, voluntariamente, através do seu corpo. Confessa-te! Tinha de confessar todos os seus pecados. Como poderia explicar, por palavras, ao padre, o que tinha feito? Tens de o fazer, tens de o fazer. Ou como conseguiria explicar-lho sem morrer de vergonha? Ou como poderia ter feito tais coisas sem vergonha? Era um louco! Confessa-te! Oh, ficaria novamente livre e limpo de pecados! Talvez o padre soubesse. Oh, meu Deus!
Continuou a caminhar incessantemente pelas ruas mal iluminadas, receando parar, nem que fosse por um momento, para que não parecesse que se estava a furtar àquilo que o esperava, receando chegar àquilo por que continuava a ansiar. Como devia ser bela uma alma em estado de graça, quando Deus a olhava com amor!
Havia raparigas andrajosas, sentadas à beira dos passeios, com os seus cestos. Os cabelos molhados caíam sobre as testas. Não eram bonitas de ver, acocoradas na lama. Mas Deus via as suas almas. E se as suas almas estivessem em estado de graça, elas seriam radiosas: e Deus amava-as, ao vê-las.
Um devastador sopro de humilhação perpassou gelidamente pela sua alma, ao pensar na sua queda, ao sentir que aquelas almas eram mais queridas para Deus do que a sua. O vento soprou sobre ele e depois sobre as miríades de outras almas sobre as quais a graça de Deus brilhava ora mais ora menos, estrelas ora brilhantes ora baças, suspensas ou em queda. E as almas cintilantes afastaram-se, suspensas e em queda, confundidas num sopro em movimento. Só uma alma estava perdida; uma alma minúscula: a sua. Tinha brilhado vagamente e tinha-se apagado, esquecida, perdida. O fim: um deserto negro, frio, vazio.
