Sustentou o olhar dele durante longo, longo tempo e depois, calmamente, baixou os olhos e fitou a corrente, agitando levemente a água com os pés, para um lado e para o outro. O primeiro ruído suave da água que se agitava quebrou o silêncio, baixo e leve e sussurrante, débil como os chocalhos das ovelhas; para cá e para lá, para cá e para lá; e um leve rubor tremulou no rosto dela.
- Deus do Céu! - bradou a alma de Stephen, numa explosão de alegria profana.
Afastou-se subitamente dela e começou a atravessar a praia. Tinha o rosto a arder; todo o seu corpo estava em chamas; os seus membros tremiam. Continuou a caminhar, sempre em frente, pela areia, até muito longe, acompanhando o cântico selvagem do mar, gritando saudações ao advento da vida que chamara por ele.
A imagem dela ficara gravada na sua alma para sempre e palavra alguma quebrara o silêncio sagrado do seu êxtase. Os olhos dela tinham-no chamado e a alma dele respondera ao apelo. Viver, errar, cair, triunfar, recriar a vida a partir da vida! Tinha-lhe aparecido um anjo rebelde, o anjo da juventude e da beleza mortais, um enviado das belas cortes da vida, para lhe abrir, num instante de êxtase, as portas de todos os caminhos do erro e da glória. Sempre em frente, em frente, em frente!
Deteve-se subitamente e escutou o seu coração, no meio do silêncio. Quanto tempo teria caminhado? Que horas seriam?
Não havia pessoa alguma perto dele nem o ar lhe trazia som algum. Mas a maré estava prestes a subir e o dia parecia desvanecer-se. Voltou para o lado da terra e correu para a margem e, subindo a encosta de areia, sem se preocupar com os seixos cortantes, descobriu um círculo de areia no meio de dunas cobertas de tufos de ervas e aí se estendeu, para que a paz e o silêncio da noite pudessem acalmar a agitação do seu sangue.