Não, até a sua alma se tornara cerosa e envelhecida naquele serviço, sem se elevar para a luz e para a beleza, nem espalhar o doce odor da santidade - uma vontade mortificada que já não reagia melhor ao entusiasmo da obediência do que ao entusiasmo do amor ou do combate o seu corpo envelhecido, magro e rijo, com pelos grisalhos de pontas prateadas.
O deão apoiou-se nos calcanhares e ficou a ver a lenha pegar fogo.
Stephen, para preencher o silêncio, disse:
- Tenho a certeza de que não seria capaz de acender um lume.
- É um artista, não é, Mr. Dedalus? - perguntou o deão, erguendo o olhar e piscando os olhos descorados. - O objectivo do artista é a criação do belo. O que é o belo, já é outra questão.
Esfregou as mãos, lenta e secamente, diante da dificuldade. - Sabe responder a essa pergunta? - inquiriu.
- Aquino - respondeu Stephen - diz pulchra sunt quae visa placenta (São belas as coisas que agradam à vista).
- O fogo diante de nós - disse o deão - agrada à vista. Será, portanto, belo?
- Na medida em que é apreendido pela vista, que, suponho, aqui significa a inrelecção estética, será belo. Mas Aquino também diz Bonum est quod tendit appetitus (É bom o que satisfaz o desejo). Na medida em que satisfaz o desejo animal de calor, o fogo é bom. No Inferno, todavia, é mau.
- Exactamente - disse o deão. - Acertou em cheio.
Pôs-se agilmente de pé e dirigiu-se para a porta, abriu-a de par em par e declarou:
- Diz-se que uma corrente de ar ajuda nestas coisas.
Quando voltou para junto da chaminé, coxeando levemente mas em passos rápidos, Stephen viu a alma silenciosa de um jesuíta fitá-lo através daqueles olhos descorados e insensíveis. Era coxo como Inácio, mas nos seus olhos não ardia a centelha do entusiasmo de Inácio.
