Retrato do Artista Quando Jovem - Cap. 5: V Pág. 256 / 273

- Nem o cu nem as calças! - exclamou Temple com desprezo. - É isso que eu chamo ao limbo.

- Dá-me essa bengala - disse Cranly.

Arrancou bruscamente a bengala de freixo da mão de Stephen e saltou os degraus: mas Ternple, ouvindo-o vir em sua perseguição fugiu pela escuridão, como um animal selvagem, ágil e veloz. Ouviram-se as pesadas botas de Cranly a correr pelo largo e depois a regressar pesadamente, frustradas, dando pontapés no cascalho a cada passo.

O seu andar era furioso e, com um gesto irado e abrupto, meteu novamente a bengala na mão de Stephen. Stephen sentiu que a sua cólera devia ter outro motivo mas, fingindo paciência, tocou-lhe levemente no braço e disse em voz baixa:

- Cranly, eu disse-te que queria falar contigo. Vamo-nos embora.

Cranly fitou-o por um momento e perguntou: - Agora?

- Sim, agora - disse Stephen. - Não podemos falar aqui. Vamo-nos embora.

Atravessaram juntos o largo sem falar. Ouviu-se, atrás deles, vindo do pórtico, o assobio modulado do apelo da ave do Siegftied. Cranly voltou-se e Dixon, que tinha assobiado, gritou-lhe:

- Para onde é que vão? Então e o jogo, Cranly?

Começaram a falar aos gritos, atravessando o ar tranquilo, de um jogo de bilhar que iria ser disputado no hotel Adelphi. Stephen continuou a caminhar sozinho, e ficou à espera, novamente cheio de paciência, na tranquilidade da Rua Kildare, diante do hotel Maple. O nome do hotel, o de uma madeira polida e pálida, e a sua fachada descolorida atingiram-no como um olhar de polido desprezo. Irritado, fitou o salão levemente iluminado do hotel, no qual imaginava que as vidas suaves dos patrícios da Irlanda se abrigavam tranquilamente. Só pensavam em comissões militares e corretores de propriedades; os camponeses saudavam-nos pelas estradas rurais; conheciam os nomes de certos pratos franceses e davam ordens aos cocheiros com vozes provincianas que transpareciam através da pronúncia cuidadosa.





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