Retrato do Artista Quando Jovem - Cap. 2: II Pág. 63 / 273

A fraqueza e a timidez e a inexperiência abandoná-lo-iam, nesse momento mágico.

Certa manhã, pararam diante da porta duas grandes carroças amarelas e os homens entraram pesadamente na casa, para a desmantelar. As mobílias foram transportadas para o jardim da frente, que ficou juncado de feixes de palha e de pontas de cordas, e depois colocadas dentro das enormes carroças junto do portão. Depois de estarem bem acondicionadas, as carroças partiram, com estrépito, avenida abaixo; e, da janela da carruagem, onde estava sentado com a mãe, que tinha os olhos avermelhados, Stephen vira-as estrondear pela Estrada de Merrion.

O lume da sala não queria pegar, nessa noite, e Mr. Dedalus encostou o atiçador à grade, para atrair a chama. O tio Charles

. dormitava a um canto da sala seminua e destituída de tapetes e, perto dele, os retratos de família estavam encostados à parede. O candeeiro da mesa derramava uma luz fraca sobre as tábuas do soalho, enlameado pelos pés dos carregadores. Stephen estava sentado num escabelo, ao pé do pai, escutando q seu longo e incoerente monólogo. A princípio, pouco ou nada compreendeu, mas foi-se apercebendo lentamente de que o pai tinha inimigos e de que se preparava uma luta. Sentiu, também, que estava a ser convocado para esse combate e que estava a ser depositado um dever sobre os seus ombros. O súbito desaparecimento do conforto e do ambiente sonhador de Blackrock, a passagem através da cidade sombria e enevoada, a ideia da casa nua e triste em que agora iriam viver tornavam o seu coração pesado, e sentiu de novo uma intuição, uma presciência do futuro. Compreendeu também o motivo por que os criados sussurravam no vestíbulo e por que o pai ficara tantas vezes de pé, de costas para a lareira, falando em voz alta com o tio Charles que insistia com ele para que se sentasse e jantasse.





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