No vestíbulo, as crianças que haviam ficado até mais tarde vestiam as suas roupas; a festa terminara. Ela tinha posto um xaile sobre os ombros e, enquanto caminhavam juntos para o tramway, ele sentia o seu hálito fresco e morno que flutuava alegremente em volta da sua cabeça tapada, e os sapatos dela batiam alegremente sobre o gelo da rua.
Era o último tramway. Os cavalos castanhos e magros sabiam-no e sacudiam as suas campainhas na noite, límpidas, num aviso. O cobrador conversava com o condutor, e ambos acenavam frequentemente com a cabeça, à luz verde da lanterna. Sobre os lugares vagos do tramway, havia bilhetes coloridos espalhados. Não se ouviam passos a subir ou a descer a rua. Som algum irrompia da noite, excepto quando os esguios cavalos castanhos esfregavam os focinhos e faziam soar as suas campainhas.
Eles pareciam escutar, ele no degrau superior, ela no inferior.
Ela subiu diversas vezes até junto dele e voltou a descer para o seu degrau, entre as frases que trocaram, e, por uma ou duas vezes, deixou-se ficar junto dele, no degrau superior, esquecendo-se de descer, e só depois descia. O coração dele dançava ao ritmo dos seus movimentos, como uma bóia na maré. Escutou o que os olhos dela lhe diziam por baixo do capuz e soube que, num obscuro passado, na sua vida ou em sonhos, já tinha ouvido aquela linguagem. Via-a exibir as suas frivolidades, o seu bonito vestido e a sua faixa, e as longas meias pretas, e percebeu que já havia cedido um milhar de vezes aos seus atractivos. Todavia, uma voz dentro dele falou mais alto do que o ruído do seu coração agitado, insistindo com ele para que aceitasse a sua dádiva, para o que lhe bastaria estender uma mão. E recordou-se do dia em que ele e Eileen tinham estado juntos no terreno do hotel, a ver os criados içarem uma bandeira no poste e o fox terrier a correr de um lado para o outro, no relvado cheio de sol e, subitamente, ela tinha desatado a rir e descera, correndo, a curva do caminho.
