Mas devo confessar que, após ter-me excedido um tanto a falar do meu amado país, do nosso comércio e das nossas batalhas em terra e no mar, dos nossos cismas religiosos e dos nossos partidos políticos, os preconceitos da sua educação pesaram tanto nele que não pôde evitar agarrar-me com a mão direita e acariciar-me suavemente com a outra e, depois de se ter rido, perguntou-me se era liberal ou conservador. A seguir, voltando-se para o seu primeiro-ministro que se encontrava atrás dele com o bastão branco, quase tão alto como o mastro principal de um navio-almirante, comentou sobre quão vis eram as grandezas humanas que podiam ser imitadas por um insecto tão diminuto como eu; e, ainda assim, acrescentou: «Atrever-me-ia a afirmar que estas gentes que possuem títulos e condecorações, projectam nichos e tocas a que dão nome de casas e cidades, preocupam-se com o vestuário e as carruagens, são gentes que amam, lutam, brigam, enganam e traem.» E assim continuou enquanto o meu rosto enrubescia e empalidecia de indignação ao escutar como a nossa nobre nação, senhora das artes e das armas, látego da França, árbitro da Europa, sede da virtude, da piedade, da honra e da verdade, orgulho e inveja do mundo, era tratada com tanto desprezo.
Mas como não estava em situação de considerar-me ofendido, comecei a pôr em dúvida, depois de mais prolongada reflexão, se fora ou não insultado. Mas, após vários meses de estadia, já acostumado a ver e a lidar com esta gente e estabelecendo a proporção em cada objecto que via, o horror que a princípio sentira ante a sua aparência e corpulência dissipara-se, de tal modo que, depois de me lembrar de ver um grupo de damas e lordes ingleses, com os seus ornamentos e trajes de cerimónia, representando no modo mais cortesão os respectivos papéis, pavoneando-se, fazendo vénias e tagarelando, estaria tentado, a falar verdade, a rir-me deles tanto como o rei e os grandes do reino se riam de mim.
