Contou como me descobriu pela primeira vez; que o meu corpo estava revestido de peles e pêlos de outros animais; que falava o meu próprio idioma e dominava o deles na perfeição; que lhe descrevera os incidentes que o tinham levado à ilha; que ele me vira completamente nu e que era o reflexo exacto de um yahoo, embora mais branco e com garras mais curtas. Acrescentou como procurara convencê-lo de que no meu país e noutros os yahoos constituíam a classe animal mais digna e racional e que tinham escravizado os houyhnhnms; que observara em mim todas as características de um yahoo, embora algo mais refinado por certos vestígios de racionalidade, mas que estava em condições de inferioridade relativamente aos houyhnhnms, como os yahoos deste país o estavam relativamente a mim; que, entre outras coisas, lhe mencionara o nosso costume de castrar os houyhnhnms quando jovens para domesticá-los; que a operação era fácil e segura; que não havia com que envergonhar-se por se aprender com a sabedoria animal, já que a formiga nos ensina a ser activos e a andorinha a fazer ninho (assim traduzo a palavra
lyhannh, embora seja um pássaro de maior tamanho). Que tal técnica podia ser aplicada aos yahoos deste país, o que, para além de os tornar mais domesticáveis e adequados para os diversos fins, permitiria exterminar a raça ao fim de duas gerações, sem execução sangrenta. Que, entretanto, os houyhnhnms deviam ser convidados a criar asnos, pois além de serem animais mais valiosos sob qualquer ponto de vista, oferecem a grande vantagem de estar aptos para o trabalho aos cinco anos de idade (os yahoos só o estão aos doze).
Isto foi tudo o que o meu amo considerou oportuno revelar-me então sobre o desenrolar da assembleia. O leitor em breve tomará conhecimento dos perniciosos efeitos de um pormenor sobre mim e que o meu amo preferiu ocultar-me.
