A Linha de Sombra - Cap. 5: III Pág. 85 / 155

Burns tinha apenas a força necessária para aguentar que o levassem em braços, mais nada. Não resistiria, porém, a uma recaída febril. À minha frente, estava uma viagem de talvez sessenta dias, com uma navegação inicial complicada e com um final provavelmente exposto a um mau tempo considerável. Ser-me-ia possível correr o risco de ter que a fazer sozinho, sem imediato e com um segundo piloto que era uma criança perfeita?

Poderia acrescentar também que se tratava do meu primeiro comando. Provavelmente não se esquecera dessa circunstância, ao calar-se. No meu espírito era um facto de primeira importância.

O médico aconselhou-me com toda a seriedade a telegrafar para Singapura, pedindo um imediato. Embora tivesse que adiar a minha largada por mais uma semana.

«Nem mais um dia», disse eu. Só essa ideia bastava para me arrepiar. Todos os membros da tripulação pareciam estar manifestamente em boa forma. Todos, e a ocasião era a melhor para os pôr a andar dali para fora. Uma vez no mar, não receava fosse o que fosse que tivesse que enfrentar. O mar era agora o remédio para todas as minhas preocupações.

Os óculos do médico focavam-me como duas lâmpadas que tentassem investigar a validade da minha resolução. Abriram-se-lhe os lábios, como se fosse continuar com os seus argumentos, mas voltou a fechá-los sem nada dizer. Passou por mim uma imagem do desgraçado Burns, na sua situação de esgotamento, de abandono e de angústia, tão viva que me perturbou mais do que a sua imagem real de que só uma hora me separava. Burns surgia-me livre dos inconvenientes da sua personalidade, e não fui capaz de lhe resistir.

«Ouça-me, doutor», disse eu, «a não ser que o senhor me comunique oficialmente que ele não deve ser deslocado de onde está, vou ordenar as coisas de maneira a que o tragam amanhã para bordo e sairei com o navio depois de amanhã, pela manhã, mesmo que tenha que atracar fora da barra, aprontando o navio para a viagem durante alguns dias.





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