A Linha de Sombra - Cap. 6: IV Pág. 91 / 155

Sentia-me extremamente cansado. As próprias estrelas pareciam cansadas de esperar pelo romper do sol. Este chegou por fim, com um vivo fulgor de madrepérola no zénite, como eu nunca na minha vida o vira nos trópicos, sem cintilação, quase acinzentado, numa singular reminiscência de outras latitudes mais altas.

Da proa, gritou a voz do marinheiro de vigia: «Terra pela amurada de bombordo!»

«Está bem!»

Apoiado no corrimão do tombadilho, não levantei sequer os olhos. A marcha do navio era insensível. Ransome trouxe-me então a chávena de café da manhã. Depois de o beber, olhei para a proa, e na banda calma cor de laranja ténue, muito brilhante, vi o perfil da terra baixa, como se estivesse recortada num papel negro e dando a impressão de, leve como cortiça, flutuar à tona da água. Mas o sol nascente transformou tudo aquilo numa simples massa de vapor escuro, numa sombra duvidosa e densa, tremeleando o seu revérbero escaldante.

O quarto terminou com a baldeação do navio. Desci e detive-me à porta do camarote de Burns (ele não tolerava que a fechassem), mas hesitei em dirigir-me a ele até ao momento em que vi os olhos mexerem-se-lhe, Dei-lhe as últimas novidades.

«Avistei o cabo Liant já com luz do dia. Mais ou menos, a umas quinze milhas.»

Moveram-se-lhe os lábios, mas não conseguia ouvir nada, antes de me inclinar na sua direcção e distinguir assim o seguinte comentário mal-humorado: «É como andar de gatas... má sorte!».

«Mesmo assim, é melhor do que ter o navio parado por completo», fiz-lhe notar resignadamente e abandonando-o às fantasias e pensamentos que o assaltavam no decorrer da sua prostração desesperada.

Mais tarde, nessa mesma manhã, depois de rendido pelo segundo piloto, lancei-me num beliche, e, durante perto de três horas, consegui um real esquecimento do mundo.





Os capítulos deste livro