Guardei metade num sobrescrito, como viu.
- Porquê metade, Holmes?
- Não gosto, meu caro Watson, de me atravessar no caminho da polícia. Deixo-lhe todas as provas que descubro. O veneno continua sobre a placa de mica; assim eles tenham a esperteza de o encontrar. Agora, Watson, vamos acender o nosso candeeiro; tomaremos, no entanto, a precaução de abrir a janela para evitar a morte prematura de dois prestimosos cidadãos, e você sentar-se-á perto da janela aberta, numa poltrona, salvo se, inteligente como é, decidir manter-se fora de tudo isto. Oh, colabora, não é verdade? Eu conheço o meu Watson. Vou colocar esta cadeira frente à sua, para ambos ficarmos à mesma distância do veneno e face a face. Deixaremos a porta aberta. Estaremos em posição de nos observarmos um ao outro e de interromper a experiência se os sintomas forem alarmantes. Entendido? Vou então tirar o nosso pó, ou o que resta dele, do sobrescrito, e deitá-lo sobre o candeeiro aceso. Pronto! Sentemo-nos, Watson, e aguardemos os acontecimentos.
Não tardaram a verificar-se. Mal acabava de me sentar comecei a sentir um consistente cheiro almiscarado, subtil e enjoativo. À primeira aspiração perdi todo o domínio sobre o cérebro e a imaginação. Uma nuvem espessa, negra, formou-se ante os meus olhos, e o meu espirito disse-me que naquela nuvem, invisível ainda mas prestes a lançar-se sobre os meus sentidos atónitos, se ocultava tudo o que era vagamente horrível, tudo o que era monstruoso e maléfico, para além do concebível no universo. Formas indefinidas navegavam, rodopiantes, na nuvem escura cada uma delas ameaça e aviso de algo iminente, o advento de um indizível habitante à porta, cuja sombra só por si esmagaria a minha alma.