O Primo Basílio - Cap. 6: CAPÍTULO VI Pág. 172 / 414

Ela assustou-se, desceu rapidamente o véu. Basílio foi abrir. Uma voz adocicada, cheia de ss melífluos, ciciou baixo. Luísa ouviu vagamente: - Sossegadinhos, suas chavezinhas...

- Bem, bem! - disse Basílio apressado, batendo com a porta.

- Quem é?

- É a patroa.

O céu pusera-se a enegrecer; já a espaços grossas gotas de chuva se esmagavam nas pedras da rua; e um tom crepuscular fazia o quarto mais melancólico.

- Como descobriste tu isto? - perguntou Luísa, triste.

- Inculcaram-mo.

Outra gente, então, tinha vindo ali, amado ali? - pensou ela. E a cama pareceu-lhe repugnante.

- Tira o chapéu - disse Basílio, quase impaciente -, estás-me a fazer aflição com esse chapéu na cabeça.

Ela soltou devagar o elástico que o prendia, foi pô-lo no canapé de desconsoladamente.

Basílio tomou-lhe as mãos, e atraindo-a, sentando-se na cama:

- Estás tão linda! - Beijou-lhe o pescoço, encostou a cabeça ao peito dela. E com a vista muito quebrada:

- O que eu sonhei contigo esta noite!

Mas de repente, uma forte pancada de chuva fustigou os vidros. E imediatamente bateram à porta, com pressa.

- Que é? - bradou Basílio furioso.

A voz cheia de ss explicou que esquecera um cobertor na varanda que estava à secar. Se se encharcasse, que perdição!...

- Eu lhe pagarei o cobertor, deixe-me! - berrou Basílio.

- Dá-lhe o cobertor...

- Que a leve o diabo!

E Luísa, sentindo um arrepio de frio nos seus ombros nus, abandonava-se com uma vaga resignação, entre os joelhos de Basílio - vendo constantemente voltada para si a face alvar do piloto.

Assim um iate que aparelhou nobremente para uma viagem romanesca vai encalhar, ao partir, nos lodaçais do rio baixo; e o mestre aventureiro, que sonhava com os incensos e os almíscares das florestas aromáticas, imóvel sobre o seu tombadilho, tapa o nariz aos cheiros dos esgotos.





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