Voltou a sentar-se ao pé dela, e tocando-lhe timidamente no braço, muito baixo:
- É necessário tirar-lhe as cartas...
- Mas como?
Sebastião coçava a barba, a testa.
- Há de se arranjar - disse, por fim.
Ela agarrou-lhe a mão:
- Oh, Sebastião, se fizesse isso!
- Há de se arranjar.
Esteve um momento calculando - e com o seu tom grave:
- Eu vou-me entender com ela... É necessário que ela esteja só em casa... Podiam ir ao teatro, esta noite.
Levantou-se lentamente, foi buscar o Jornal do Comércio sobre a mesa, olhou os anúncios:
- Podiam ir a São Carlos, que acaba mais tarde... É o Fausto... Podiam ir ver o Fausto...
- Podíamos ir ver o Fausto... - repetiu Luísa, suspirando.
E então, muito chegados, ao canto do sofá, Sebastião foi-lhe dizendo um plano, em palavras baixas, que ela devorava, ansiosa.
Devia escrever a D. Felicidade, para a acompanhar ao teatro... Mandar um recado a Jorge, prevenindo-o que o iriam buscar ao Hotel Gibraltar... E a Joana? A Joana deixara a casa. Bem. Às nove horas, então. Juliana estaria só.
- Vê como tudo se arranja? - disse ele, sorrindo.
Era verdade... Mas daria a mulher as cartas?
Sebastião tornou a coçar a barba, a testa:
- Há de dar - disse.
Luísa olhava-o quase com ternura: parecia-lhe ver, na sua face honesta, uma alta beleza moral. E de pé diante dele, com uma melancolia na voz:
- E vai fazer isso por mim, Sebastião, por mim, que fui tão má mulher...
Sebastião corou, respondeu encolhendo os ombros:
- Não há más mulheres, minha rica senhora, há maus homens, é o que há!
E acrescentou logo:
- Eu vou buscar o camarote. Uma boa frisa, hem?... Uma frisazinha ao pé do palco...
Sorria para a tranquilizar. Ela punha o chapéu, descia o véu com pequeninos soluços tristes, que voltavam a espaços.