O Bobo - Cap. 4: IV - Receios e esperanças Pág. 37 / 191

O cavalariço despertou, gemendo, a um rijo pontapé do cavaleiro. Este montou de salto na mula, cravando-lhe os acicates no ventre, galgou pelo portal da torre albarrã, e, correndo ao longo da couraça, sem saber como, achou-se à porta da sua pousada, no bairro coutado e honrado do burgo. No meio de desesperação profunda, uma luz ténue lhe bruxuleava na alma. Dulce prometera explicar-lhe o motivo por que refucava tanto amor. Esta revelação seria feita no dia imediato. A hora aprazada fora a do pôr do Sol; o lugar, a galilé contígua à sala de armas, que dava sobre os adarves do norte, e que a esse tempo devia estar erma. Era uma noite e um dia eternos, que tinha de viver entretanto; mas a esperança mais débil arrosta com a eternidade, e bem que frouxamente o cavaleiro esperava ainda, posto que não ousasse dizê-lo a si mesmo, e talvez nem sequer o cresse.

Daí a pouco tudo parecia dormir no castelo e no burgo. Não era assim: neste velava Garcia Bermudes; naquele o conde Fernando de Trava, a bela infanta e Dulce. Eram quatro agonias, tremendas todas; mas todas elas diferentes.

A variedade é o que mais ama na vida o coração humano. A Providência não se esqueceu de conceder-lhe em grau infinito a variedade na dor.





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