- Tem razão, senhor pároco, tem razão, murmurou a velha muito contrita. Eu às vezes nem sei o que digo... São coisas da doença.
- Bem, bem, minha senhora, é resignar-se e tratar de ver tudo cor-de-rosa. É o sentimento que Deus mais aprecia. Eu compreendo que é duro estar para aqui enterrada...
- É o que diz o Sr. abade Ferrão, acudiu Amélia voltando da janela, a madrinha estranha... Assim arrancada aos hábitos de tantos anos...
Notando então a citação repetida das palavras do abade Ferrão, Amaro perguntou se ele costumava vir vê-las.
- Ai, tem-nos feito muita companhia, disse Amélia. Vem quase todos os dias.
- É um santo! exclamou a Gertrudes.
- Decerto, decerto, murmurou Amaro descontente dum entusiasmo tão vivo. Pessoa de muita virtude...
- De muita virtude, suspirou a velha. Mas... - calou-se, não ousando decerto exprimir as suas reservas de devota. E exclamou numa súplica: Ai, o senhor pároco é que devia vir por aqui, ajudar-me a levar esta cruz da doença...
- Hei-de vir, minha senhora, hei-de vir. É bom para a distrair, para lhe dar as noticias... E a propósito, tive ontem carta do nosso cónego.
Rebuscou na algibeira, leu alguns períodos da carta. O padre-mestre já tinha quinze banhos. A praia estava cheia de gente. A D. Maria passara doente com um furúnculo. O tempo famoso. Todas as tardes grandes passeatas a ver recolher as redes. A S. Joaneira, boa, mas falando sempre na filha...
- Pobre mamã... choramigou Amélia.
Mas a velha não se interessava com as novidades, gemendo a sua ronqueira. Foi Amélia que perguntou pelos amigos de Leiria, pelo Sr, padre Natário, pelo Sr, padre Silvério...