Era do passeio de trenó que ele se lembrava melhor e de lhe beijar as faces frescas na palha a um canto, enquanto ela ria para as estrelas brancas e frias. O par ao lado estava de costas voltadas e ele beijou-lhe o pescoço delicado e as orelhas, e nunca os lábios.
- E a festa do Mack, onde brincaram aos correios e eu não pude ir porque estava com papeira disse ele.
- Não me lembro disso.
- Ora, estavas lá. Beijaram-te e eu fiquei danado com ciúmes como nunca mais tive.
- É esquisito, não me lembro. Talvez tenha querido esquecer.
- Mas porquê? - perguntou ele divertido. Éramos dois miúdos perfeitamente inocentes, Nancy. Sempre que eu falava com a minha mulher acerca do passado, dizia-lhe que tu foste a rapariga que eu amei quase tanto como a ela. Mas acho que realmente te amei tanto como a ela. Quando saímos da cidade levei-te dentro de mim como uma bala de canhão.
- Estavas assim tão entusiasmado?
- Santo Deus, se estava! - De repente ele apercebeu-se de que estavam a meio metro um do outro, que estava a dizer coisas como se estivesse apaixonado por ela naquele momento, que ela o olhava com os lábios semi-cerrados e um olhar embaciado.
- Continua - disse ela. - Tenho vergonha de o dizer, mas estou a gostar. Não sabia que estavas tão transtornado nessa época. Julgava que eu é que estava.
- Tu! - exclamou ele. - Não te lembras de me teres mandado passear no café? - Riu-se. - Deitaste-me a língua de fora.
- Não me lembro de todo. Parecia-me que tu é que me tinhas mandado passear. - A mão dela tocou-lhe no braço ao de leve, quase consoladora. Tenho lá em cima um álbum de fotografias; não olho para ele há anos. Vou descobri-lo.
Donald ficou sentado durante cinco minutos com dois pensamentos: primeiro, a desesperante impossibilidade de conciliar o que diferentes pessoas recordavam sobre o mesmo acontecimento; e depois que, de uma forma assustadora, Nancy o impressionava como mulher como o impressionara como criança.