É bem possível que me houvessem mandado para Albacete, antes de começar a luta em Barcelona, e nesse caso, não tendo assistido à luta de perto, eu poderia ter aceito a versão oficial que foi dada à mesma, achando-a verdadeira. Por outro lado, se estivesse em Barcelona durante a luta, sob ordens comunistas mas sentindo ainda fidelidade pessoal aos meus camaradas no P.O.U.M., teria ficado em posição impossível. Mas restava-me ainda uma semana de licença, e eu ansiava por endireitar a saúde antes de regressar à linha de frente. E aconteceu também - no tipo de detalhe que está sempre a resolver o destino das pessoas - que tive de esperar enquanto os sapateiros fabricavam um novo par de botinas de marcha. (Em todo o exército espanhol eu não conseguira encontrar um par de botinas suficientemente grandes para meus pés.) Disse ao meu amigo comunista que faria os preparativos mais tarde e, enquanto isso, queria descansar. Tinha até a ideia de que nós - minha mulher e eu - poderíamos ir à costa marítima por dois ou três dias. Que ideia! A atmosfera política deveria ter-me prevenido que isso não era tipo de coisa possível naqueles dias.
E digo isso porque, sob o aspeto superficial da cidade, sob o luxo e pobreza crescente, sob a parecença da alegria das ruas, com seus balcões de flores, suas bandeiras multicores, cartazes de propaganda e multidões em grande movimento pelas ruas, existia um sentimento iniludível e horrível de rivalidade e ódio políticos. As pessoas de todas as opiniões estavam dizendo, em tom de presságio: "Não vai tardar a formar-se barulho". O perigo mostrava-se bastante simples e inteligível. Era o antagonismo entre os que desejavam o prosseguimento da revolução e os que a queriam impedir ou deter - em última instância, uma disputa entre anarquistas e comunistas. Politicamente, não havia agora qualquer poder na Catalunha, com exceção do P.S.U.C. e seus aliados liberais. Mas contra isso existia a força incerta da C.N.T., menos bem armada e menos ciente do que queria, em comparação a seus adversários, mas poderosa devido a seu número e predomínio em diversas indústrias principais. Diante desse alinhamento de forças, era provável a eclosão de luta. Do ponto de vista do Generalato controlado pelo P.S.U.C., a primeira necessidade para assegurar sua posição estava em retirar as armas das mãos dos trabalhadores filiados à C.N.T.