Retrato do Artista Quando Jovem - Cap. 1: I Pág. 17 / 273

Wells disse:

- Não fiz de propósito, palavra de honra. Era só uma brincadeira. Desculpa.

O rosto e a voz desapareceram. Pedia desculpa porque sentia medo. Medo de que ele tivesse ficado doente. As pragas são doenças das plantas, a peste é doença dos animais; ou qualquer outra. Isso tinha sido havia muito tempo, no pátio de recreio, à luz do entardecer, arrastando-se entre um ponto e outro, no limite da sua linha, uma ave pesada, a voar baixo, à luz acinzentada. A Abadia de Leicester iluminada. O Wolsey tinha morrido lá. Os próprios abades o tinham enterrado.

Não era o rosto do Wells, era o do prefeito. Ele não estava a fingir. Não, não; estava realmente doente. Não era fingimento. E sentiu a mão do prefeito na sua testa; e sentiu a sua testa quente e húmida sob a mão fria e húmida do prefeito. Era assim que devia ser um rato, viscoso, húmido e frio. Todos os ratos tinham dois olhos para olhar. E peles macias e viscosas, patinhas muito pequenas encolhidas, para saltar, olhos pretos e viscosos para olhar para nós. Os ratos eram capazes de saber como se saltava. Mas as suas mentes não podiam abarcar a trigonometria. Quando morriam, ficavam deitados de lado. As suas peles secavam. Não passavam de coisas mortas.

O prefeito tinha voltado e era a sua voz que dizia que ele tinha de se levantar, que o reitor tinha dito que ele tinha de levantar-se e ir para a enfermaria. E, enquanto se vestia o mais depressa que podia, o prefeito disse:

- Temos de despachar para o irmão Michael quem sente dores de barriga!

Era simpático da sua parte dizer aquilo. Era só para o fazer rir.

Mas ele não conseguiu rir porque lhe tremiam as bochechas e os lábios; e o prefeito teve de rir-se sozinho.

O prefeito gritou:

- Ordinário, marche! Esquerdo! Direito!

Subiram juntos a escada e seguiram pelo corredor, passando pela casa de banho.





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