A luz fria da madrugada cobria a região, estendendo-se sobre os campos despovoados e as casinhas fechadas. O terror do sono fascinava a sua mente, ao observar a região silenciosa ou ao escutar, de vez em quando, a profunda respiração do pai ou os seus súbitos movimentos durante o sono. A proximidade de invisíveis pessoas adormecidas enchia-o de um estranho receio, como se elas pudessem fazer-lhe mal, e rezou para que o dia chegasse depressa. A sua oração, que não se dirigia nem a Deus nem aos santos, principiou com um arrepio, quando a gélida brisa matinal penetrou pela fenda da porta da carruagem até aos seus pés, e terminou numa sequência de palavras sem sentido que adaptou ao ritmo insistente do comboio; e, silenciosamente, a intervalos de quatro segundos, os postes telegráficos dividiam as notas galopantes da música entre compassos pontuais. Esta música febril afastou o seu receio e, encostando-se ao peitoril da janela, fechou de novo os olhos.
Atravessaram rapidamente Cork, ainda de manhã cedo, e Stephen terminou o seu sono num quarto do Hotel Victoria. A viva e quente luz do 501 entrava pela janela e ele ouvia o ruído do trânsito. O pai encontrava-se sentado diante do toucador, observando o cabelo, o rosto e o bigode cuidadosamente, estendendo o pescoço sobre o jarro da água e afastando-o para o lado, para ver melhor. Enquanto o fazia, cantarolava em voz baixa, para si mesmo, com uma pronúncia e uns versos curiosos:
A mocidade e a loucura
Fazem as jovens casar,
Por isso, meu aoar,
Eu vou pôr-me a andar.
A que não se consegue curar,
Tem, por certo, que fazer sofrer,
Por isso vou pôr-me a andar,
Vou pra América viver.
A minha amada é formosa,
A minha amada é perfeita:
Faz lembrar o uísque novo,
Quando é de boa colheita;
Mas quando já está velho
E vai perdendo o fulgor,
Vai morrendo pouco a pouco,
Como o orvalho ao calor.