As Viagens de Gulliver - Cap. 4: Capítulo II Pág. 147 / 339

Sua Majestade, noutra audiência, deu-se ao incómodo de recapitular tudo o que lhe dissera, comparando as suas perguntas com as minhas respostas. Acto contínuo, agarrou-me entre as suas mãos e, acariciando-me com suavidade, exprimiu-se em termos e de uma maneira inesquecíveis: «Meu pequeno Gildrig, fizeste um elevadíssimo panegírico do teu país. Afirmaste com clareza que os requisitos de um legislador são a ignomínia, a incapacidade e o vício; e que ninguém explica, interpreta ou aplica as leis tão bem como aqueles que com o seu talento e interesse as pervertem, confundem e iludem. Observo nas vossas instituições alguns aspectos possivelmente aceitáveis nos seus começos, mas estão, na actualidade, um tanto apagados, esbatidos, desnaturados pelos abusos. Pelo teu relato não se depreende que alguma vez se tenha exigido uma única virtude para se obter um destes cargos públicos, e ainda menos que os sacerdotes sejam promovidos pela sua piedade e saber, os soldados pela sua fidelidade e valor, os juízes pela sua integridade, os membros do parlamento pelo seu patriotismo ou os conselheiros pela sua prudência. Quanto a ti prosseguiu o rei -, que passaste a maior parte da tua vida a viajar, estou disposto a conceder que até agora deves ter-te conseguido livrar dos numerosos vícios da tua pátria mas, tal como deduzi do teu próprio relato e das respostas que com grande dificuldade obtive de ti, e do que pude inferir, só posso chegar a uma conclusão: a gente da tua raça constitui, no seu conjunto, a espécie mais maligna de odiosos e pequenos insectos que a natureza criou na Terra.»





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