O Livro da Selva - Cap. 6: TUMAI DOS ELEFANTES Pág. 126 / 158

É uma canção do berço muito embaladora e a primeira estância diz assim:

Xiva, que derramava a colheita e os ventos com voz possante,
Agitava, sentado no limiar de um dia já distante,
A cada um deu seu quinhão: comida, labor, desengano,
Desde o pedinte ao portal até no trono ao Soberano,
Todos as coisas criou. Ele, Xiva, o Conservador.

Mahadeo! Mahadeo! De tudo é criador
Espinhos ao camelo, feno para os bois e à face dormente,
O coração terno de uma Mãe, Ó meu filhinho inocente!

Tumai Pequeno entrava com um alegre tanque-a-tanque no fim de cada verso, até que teve sono e se deitou no feno ao lado de Cala Nague.

Por fim, os elefantes começaram a deitar-se um após outro, como é seu costume, até que só Cala Nague, à direita da fileira, ficou de pé, balançando-se lentamente de um lado para o outro, de orelhas estendidas para a frente a escutar o vento nocturno que soprava muito brandamente através da serra. O ar andava cheio de todos os ruídos da noite, os quais, em conjunto, formam um enorme silêncio - o clis-clás das canas de bambu, o frufru de seres vivos no mato rasteiro, a arranhadura e o pio da ave meio acordada (as aves estão acordadas de noite muito mais frequentemente do que nós supomos), e a água a cair, lá muito ao longe. Tumai Pequeno dormiu algum tempo e quando acordou fazia um luar brilhante, mas Cala Nague continuava de pé com as orelhas fitas. Tumai Pequeno virou-se, fazendo sussurrar a palha, e contemplou a curva do enorme dorso de Cala Nague projectada sobre metade das estrelas do céu; e, enquanto olhava, ouviu, tão longe que não parecia mais do que um furo de alfinete no silêncio, o urro de um elefante selvagem.

Todos os elefantes da fileira se levantaram de salto, como se tivessem recebido um tiro, e com os grunhidos acordaram enfim os cornacas adormecidos, os quais, saindo dos abrigos, com grandes maças enterraram mais as estacas, apertaram esta corda, deram um nó naquela, até que de novo reinou o sossego.





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