O Livro da Selva - Cap. 3: TIGRE! TIGRE! Pág. 59 / 158

Máugli levantou-se para se retirar.

- Tenho estado aqui toda a noite a escutar - bradou ele por cima do ombro -, e, exceptuando uma ou duas vezes, Buldeo não disse uma palavra de verdade a respeito da Selva, que lhe fica às próprias portas. Como hei-de então acreditar em histórias de espíritos, deuses e duendes, que ele diz ter visto?

- É mais que tempo para este rapaz ir guardar gado - disse o maioral, enquanto Buldeo bufava e roncava perante a impertinência de Máugli.

Na maioria das aldeias indianas é costume alguns rapazes levarem os bovinos e os búfalos a pastar de manhã cedo e voltarem com eles à noite, e o mesmo gado, que seria capaz de esborrachar um branco, deixa-se bater, maltratar e increpar por crianças que mal lhe chegam ao focinho. Enquanto os rapazes acompanharem a manada estão seguros, porque nem o próprio tigre é capaz de investir contra o rebanho. Mas se se desgarram a apanhar flores ou a caçar lagartos, são por vezes arrebatados. Ao amanhecer, Máugli, montado no dorso de Rama, o grande touro da manada, atravessou a rua da aldeia; e os búfalos cor de ardósia azul, de grandes chifres invertidos e olhos ferozes, levantavam-se dos currais um a um e seguiam-no, e Máugli tornou bem claro aos miúdos que o acompanhavam, que era ele quem mandava. Batia nos búfalos com um comprido bambu luzidio e disse a Câmia, um dos rapazes, que apascentasse os bois à parte, enquanto ele seguia com os búfalos, e que tivesse muita cautela em não se afastar da manada.

As pastagens indianas são tudo rochas e charneca, com tufos de erva e barrancos, no meio dos quais as manadas se espalham e desaparecem. Os búfalos conservam-se geralmente nos charcos e sítios lodosos, onde se lançam a chafurdar ou se estendem ao sol horas seguidas, na lama tépida.