O Livro da Selva - Cap. 3: TIGRE! TIGRE! Pág. 58 / 158

Contavam histórias maravilhosas de deuses, de homens e de espíritos; e Buldeo narrava-as ainda mais extraordinárias sobre os costumes das feras da Selva, até que os olhos das crianças, sentadas fora do círculo, parecia que lhes saltavam das órbitas. A maioria dos contos eram a respeito de animais, porque a Selva lhes ficava à porta. Os veados e javalis comiam-lhes as colheitas e, de vez em quando, o tigre arrebatava um homem, ao anoitecer, à vista das portas da aldeia.

Máugli, que sabia, naturalmente, alguma coisa daquilo de que falavam, tinha de cobrir a cara para esconder o riso, enquanto Buldeo, com o mosquete da Torre sobre os joelhos, mudava de uma para outra história de maravilha, e Máugli não conseguia estar quieto com os ombros.

Buldeo estava a explicar que o tigre que arrebatara o filho de Messua era tigre encantado, que trazia no corpo a alma de um velho usurário malvado, falecido alguns anos atrás.

- E sei que assim é - disse -, porque Purun Dass sempre coxeou de uma cacetada que lhe deram num motim em que lhe queimaram os livros de contas, e o tigre de que falo, esse coxeia também, como se vê pela desigualdade dos passos que as pegadas revelam.

- Sim, sim, isso deve ser verdade - disseram os outros, abanando todos a cabeça.

- Que teias de aranha e mistificações são todos esses contos? - disse Máugli. - Esse tigre coxeia porque nasceu coxo, como toda a gente sabe. Falar da alma de um agiota, metida numa fera que nunca teve a coragem de um chacal, é infantil.

Buldeo ficou por um instante mudo de espanto e o maioral arregalou os olhos.

- Oh! É o miúdo da Selva, não é? - disse Buldeo. - Se és assim tão sabido, melhor farias levando a pele dele a Canivara, pois o Governo prometeu cem rupias por ela.





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