O Bobo - Cap. 12: XII - A mensagem Pág. 121 / 191

Fora sobre este resultado da revolta que Garcia Bermudes e Fernando Peres tinham alevantado desde o princípio a máquina das suas traças guerreiras. Longe de esperarem o ser acometido atrás de muros e barbacãs, onde se lhes tornava inútil a superioridade da cavalaria, convinha-lhes acometer os contrários em campo aberto. Aí a vitória parecia segura. Naquele tempo os peões, ou infantaria, chusma indómita – rude e mal armada –, era tida em nenhuma conta, e nos arrolamentos dos exércitos quase que não se contava senão com o número das lanças.

A certeza obtida enfim daquelas circunstâncias, que podiam produzir para o infante a desonra e a morte no momento em que chegava às cercanias de Guimarães no meio de sonhos de ambição e de esperanças de glória, mitigou algum tanto o furor do conde de Trava. Posto que ainda carrancudo, passeando na sala de armas rodeado dos seus cavaleiros, ele dispunha tudo para sair a campo. Pelas escadas dos paços viam-se descer e subir os pajens levando peças de armaduras lisas e polidas, outros arrastando os pesados saios e cervilheiras de camalho, tecidos de grossa malha de ferro, para se distribuírem pelos homens de armas de soldo e pelos cavaleiros peões. A signa real da bela infanta se plantara diante das barreiras; os balções variegados dos cavaleiros de solar e linhagem enfileiravam-se já após essa bandeira para um e para outro lado; e os atambores ou timbales mouriscos, adoptados entre os cristãos, começavam a soar pelo burgo convocando a gente de guerra em volta de seus pendões. Os rostos dos duros homens de armas de Galiza, Aragão e Castela, ferozmente alegres, sorriam com a esperança da festa de sangue que nesse mesmo dia porventura os aguardava.

No meio, porém, do nitrir dos cavalos, do redemoinhar do pó, do lampejar dos capelos ou elmos brunidos, do vozear dos cabos das quadrilhas, um som agudo e prolongado de buzina sobrelevou por cima de todo esse ruído.





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