Retrato do Artista Quando Jovem - Cap. 4: IV Pág. 183 / 273

Onde estava agora a sua adolescência? Onde estava a alma que se tinha mantido afastada do seu destino, para lamber sozinha a vergonha das suas feridas, e se refugiara na sua casa de miséria e subterfúgio, para se revestir de sudários desbotados e coroas de flores que murchavam mal lhes tocavam? E onde estava ele?

Estava sozinho. Estava livre, feliz e próximo do cerne selvagem da vida. Estava sozinho e jovem e predisposto e rebelde de coração, só, no meio do ar selvagem e das águas salobras, da colheita marinha de conchas e algas e da velada luz cinzenta e de figuras de crianças e raparigas envergando trajos alegres e de cores claras, e de vozes infantis e juvenis que se erguiam no ar.

Viu uma rapariga diante dele, a meio da corrente, só e parada, a olhar para o mar. Parecia ter adquirido, por artes mágicas, semelhanças com uma estranha e bela ave marinha. As suas pernas nuas, longas e esbeltas, eram tão delicadas como as de uma garça, e eram puras, excepto no local onde uma alga cor de esmeralda tinha aderido à sua carne, como um sinal. As suas coxas, mais cheias e um tom suave como o do marfim, estavam nuas quase até às ancas, onde as franjas brancas dos calções lembravam uma penugem branca e macia. As saias de um azul de ardósia estavam ousadamente enroladas em volta da cintura, descaindo atrás como a cauda de uma pomba. O seu peito fazia lembrar o de uma ave, macio e leve, leve e macio como o peito de uma rola de plumagem escura. Mas os seus longos cabelos louros eram juvenis, como juvenil era o seu rosto, tocado pela maravilha da beleza mortal.

Estava só e quieta, olhando para o mar; e, quando sentiu a presença dele e a adoração nos seus olhos, voltou os seus para ele, sustentando tranquilamente o seu olhar, sem vergonha nem malícia.





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