As Viagens de Gulliver - Cap. 4: Capítulo II Pág. 129 / 339

Mas o pássaro, que estava só aturdido, voltou a si e, com as asas, deu-me pancadas tão rigorosas na cabeça e no tronco que, mais do que uma vez, estive a ponto de o soltar. Tinha tomado, porém, o cuidado de agarrá-lo com os braços estendidos e de não me pôr ao alcance das suas garras. Por fim, um criado correu em minha ajuda e torceu o pescoço do pássaro que, por indicação da rainha, me serviram, no dia seguinte, à refeição. Tanto quanto recordo, este pássaro tinha uma envergadura maior que um cisne inglês.

As aias convidavam com frequência Glumdalclitch a ir aos seus aposentos pediam-lhe para me levar, para terem a satisfação de ver-me e tocar-me. Despiam-me muitas vezes dos pés à cabeça e colocavam-me completamente estendido entre os seios. Isto aborrecia-me um pouco pois, a falar verdade, sua pele exalava um cheiro muito desagradável. Ao mencionar esta circunstância não procuro menoscabar estas excelentes damas, a quem presto devido respeito. Mas creio que a acuidade do meu olfacto era directamente proporcional à minha pequenez; assim, estas ilustres pessoas não seriam más companhias nem para os seus amantes nem para os seus companheiros, tal como acontecia com pessoas da mesma estirpe em Inglaterra.

De qualquer forma, o seu cheiro natural era muito mais suportável que o dos perfumes que utilizavam, já que estes me provocavam um desmaio fulminante. Não posso esquecer que um dos meus amigos íntimos em Lilliput tomara a liberdade de queixar-se num dia de muito calor em que fizera muito exercício do cheiro forte que exalava, ainda que estivesse menos sujeito a este inconveniente que outros do meu sexo. Mas penso que a sua acuidade olfactiva era tão sensível relativamente a mim como a minha em relação a esta gente. Quanto a isto não posso deixar de prestar justiça à rainha, minha senhora, e a Glumdalditch, a minha ama: ambas exalavam a fragrância de qualquer dama inglesa.





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