A República - Cap. 1: Capítulo 1 Pág. 23 / 290

— Entendo o governante no sentido exacto da palavra—respondeu. —Para isso, tenta prejudicar-me ou caluniar-me, se puderes—não peço tréguas. Mas não és capaz!

— Imaginas que sou louco ao ponto de tentar tosquiar um leão ou caluniar Trasímaco?

— A verdade é que o acabas de tentar, ainda que inutilmente!

— Basta de palavreado! — gritei. — Mas diz-me: o médico, no sentido exacto do termo, de que falavas há pouco, tem por objecto ganhar dinheiro ou tratar os doentes? E fala-me do médico autêntico.

— Tem por objecto — respondeu — tratar os doentes.

— E o piloto? O piloto autêntico é chefe dos marinheiros ou marinheiro?

— Chefe dos marinheiros.

— Não creio que se deva ter em conta o facto de navegar num navio para que se lhe chame marinheiro; com efeito, não é por navegar que se lhe chama piloto, mas por causa da sua arte e do comando que exerce sobre os marinheiros.

— É verdade — confessou.

— Portanto, para o doente e o marinheiro existe alguma coisa de vantajoso?

— Sem dúvida.

— E a arte — continuei — não tem por finalidade procurar e proporcionar a cada um o que é vantajoso para ele?

— É isso — concordou.

— Mas, para cada arte, há outra vantagem além de ser tão perfeita quanto possível?

— Qual é o sentido da tua pergunta?





Os capítulos deste livro