Eneida - Cap. 4: Eneias e Dido Pág. 76 / 235

Procurando o mais rápido meio de suicidar-se, chamou Barce, antiga ama de Siqueu, seu marido, e disse:

— Querida ama, traz aqui minha irmã Ana, Diz-lhe que se apresse a banhar-se na água do rio e a trazer ovelhas novas para serem sacrificadas. Tu mesmo, Barce, enfeita a tua cabeça com as coroas funéreas. Quero oferecer a Júpiter os sacrifícios que preparei, segundo os rituais, e pôr fim aos meus sofrimentos, entregando o meu corpo às chamas da pira onde pus a efígie do troiano.

Logo partiu Barce para cumprir as ordens da senhora. Enquanto isso, Dido, agitada e inquieta com o fim que se aproximava, olhos sanguinolentos e face descomposta a reflectir a sombra pálida da morte, precipitou-se pelo interior da casa e subiu ao alto da pira. Lá, desembainhando a espada de Eneias — presente tão querido, mas quem adivinharia o fim para o qual seria usado!—e olhando para as roupas troianas e para o leito nupcial, parou um momento e pensamentos tristes lhe trouxeram à boca estas últimas palavras:

— Ó doces relíquias de um tempo feliz, mas tão curto, que só por isso as Parcas o permitiram, recebei esta vida e libertai-me dos meus sofrimentos. Vivi e terminei a missão que o destino me tinha imposto e agora a minha majestosa sombra vai para debaixo da terra. Fundei uma grande cidade. Vi subir as suas muralhas. Vinguei o meu esposo e castiguei o meu irmão inimigo. Teria sido feliz se nunca as quilhas troianas tivessem tocado minhas praias.

E, lançando-se sobre o leito, continuou:

— Morrerei sem vingar-me, mas morrerei. Que os cruéis olhos troianos olhem para estas chamas lá do mar distante e que elas lhes levem os agouros do meu fim.





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