ENEIAS EM APUROS
Houve grande comoção entre as fileiras cerradas quando Turno levantou o estandarte de guerra. Ressoaram as trombetas, excitaram-se os corcéis e ouviu-se um retinir de armas por todo o campo. O Lácio inteiro ali reunido animava-se contra o inimigo. Os capitães arrancavam os homens dos arados e das foices, deixando as culturas abandonadas, percorriam as cidades e os campos arrebanhando guerreiros para as suas legiões. O príncipe rótulo enviou Vénulo, mensageiro, à cidade do grande Diomedes, para pedir auxilio contra os dardanios, acampados às margens do Tibre. Dizia a mensagem que Eneias queria coroar-se rei do Lácio. Diomedes, afamado herói da guerra de Tróia, conhecia melhor — as sim se esperava — as tácticas de batalha de Eneias, troiano, que Turno e os seus comandados.
No entanto, enquanto se passavam estes acontecimentos não tinha sossego a mente inquieta do jovem Turno. Pensava em vários planos, ora aceitando-os, ora recusando-os, como quando a luz incide trémula sobre a água, vinda do Sol ou da Lua, e vagueia daqui para ali e para acolá, em muitos lugares.
Era noite e o profundo sono por toda a terra apoderara-se dos animais cansados, das aves e do gado, quando Eneias se deitou na praia, ao relento frio, com o coração inquieto por aqueles preparativos de guerra, dando repouso merecido ao corpo. Apareceu-lhe então em sonhos o velho Tiberino, deus do rio, surgido por entre a folhagem dos altos choupos, com o cabelo encanecido meio escondido entre os ramos das árvores. Um véu cinzento de névoa pendia-lhe do rosto e uma coroa de caniços adornava-lhe a cabeça. E falou-lhe:
— Ó descendente da raça dos deuses que plantas a cidade troiana no meio dos inimigos, segundo a vontade dos deuses e as predições dos oráculos, não temas as ameaças de guerra, nem afrouxes o animo na empresa a que te lançaste, pois no fim vencerás. A cólera e o ressentimento dos deuses já se aplacaram contra ti.