Eneida - Cap. 5: Os Jogos Fúnebres Pág. 94 / 235

Assim também os troianos corriam, giravam, abriam e fechavam fileiras, leques, círculos, faziam fugas e combates simulados, à semelhança dos delfins que, nadando pelos mares, cortam as ondas em alegres brincadeiras. Tal costume seria implantado mais tarde por Ascânio, entre os seus súbditos, quando governasse a sua cidade de muros altos, lembrando-se daqueles exercícios, daqueles combates figurados, daqueles ensinamentos da arte da guerra através do desporto e que tinham constituído uma das alegrias da sua mocidade. A grande Roma os receberia e conservaria através dos tempos chamando Tróia ao jogo e Esquadrão Troiano aos jovens cavaleiros. O treino a que assim se submetiam foi o cerne do enorme poderio da terra dos Césares.

Mas, enquanto todos os troianos prestavam reunidos a sua homenagem ao bom pai Anquises, lá no Olimpo continuava Juno a maquinar a desgraça deles, em nada diminuído o ressentimento em relação à nação de Eneias, e resolveu enviar Iris à Sicília. Deslizando pelo arco de mil cores, chegou a deusa acima da multidão que, ansiosa, esperava as outras provas: lançamento de dardo e disco, luta livre, e outras. Viu então o porto deserto, a armada abandonada e na areia um grupo de mulheres troianas que choravam juntas as suas mágoas. Diziam:

— Ah, quanto tempo ainda viajaremos por esses mares além, antes que encontremos repouso?

Desejavam os muros amigos de uma cidade, uma lareira e uma casa abrigada. Meteu-se íris entre elas, tomando a forma da velha Béroe, esposa do trácio Dóriclo, e disse:

— Ó miseráveis, a quem os gregos vencedores não arrastaram à morte, na guerra junto as muralhas de Tróia! Ó nação infeliz, que desgraças mais te esperam para o futuro? Já se passam sete anos que somos levados por esses mares e terras estranhas, depois da destruição da nossa pátria. Quanto mais viajamos pelos rochedos inóspitos, mais a Itália se afasta, embalada pelas ondas. Aqui estamos nós em terra amiga, nos reinas de Érice e Acestes, nosso anfitrião. Quem nos proíbe de lançar os nossos muros nestas praias e dar uma cidade aos troianos? Para que, afinal, roubamos do inimigo os nossos deuses domésticos, se em nenhuma parte conseguimos reconstruir a nossa pátriaT róia, rever os nossos rios Xanto e Simois? Portanto, vinde comigo e apressemo-nos a queimar os navios infaustos.





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