Procurar livros:
    Procurar
Procurar livro na nossa biblioteca
 
 
Procurar autor
   
Procura por autor
 
marcador
  • Sem marcador definido
Marcador
 
 
 

Capítulo 2: II - Dom Bibas

Página 10

O circuito, que tão temerosas fortificações abrangiam, encerrava uma nobre alcáçova, que, também coberta de ameias, campeava sobranceira aos lanços de muros entre torre e torre, e ainda assoberbava estas, à excepção da alvarrã ou de menagem, que, maciça e quadrangular, com os seus esguios miradouros bojando nos dois ângulos exteriores, e erguida sobre o escuro portal da entrada, parecia um gigante em pé e com os punhos cerrados sobre os quadris, ameaçando o burgo rasteiro e humilde, que, lá em baixo no sopé da suave encosta, se encolhia e apoquentava, como vilão que era, diante de tamanho senhor. Mas não vedes aí ao longe, por entre a casaria da povoação e verdura das almuinhas, que, entressachadas com os edifícios burgueses, servem como vasto tapete, onde assentam os panos de muros alvos, e os telhados vermelhos e aprumados das casas modestas dos peões? Não vedes, digo, a alpendrada de uma igreja, a portaria de um ascetério, a grimpa de um campanário? É o Mosteiro de D. Mumadona: é um claustro de monges negros; é a origem desse burgo, do castelo roqueiro e dos seus paços reais. Havia duzentos anos que neste vale viviam apenas alguns servos, que cultivavam a vila ou herdade de Vimaranes. Mas o mosteiro edificou- -se, e a povoação nasceu. O ameno e aprazível sítio atraiu os poderosos: o conde Henrique quis aí habitar algum tempo, e sobre as ruínas de um fraco e pequeno castelo, a que os monges se acolhiam ante o assolador tufão das correrias dos Mouros, se alevantou aquela máquina. O trato e frequência da corte enriqueceu os burgueses: muitos francos, vindos em companhia do conde, aí se tinham estabelecido, e os homens de rua, ou moradores do burgo, constituíram-se em sociedade civil. Então surgiu o município: e essas casas, aparentemente humildes, encerravam já uma porção do fermento da resistência antiteocrática e antiaristocrática, que, espalhado gradualmente pelo país, devia em três séculos pôr manietados aos pés dos reis a aristocracia e a teocracia. Os imperantes supremos, enfarados já na caça, que abasteceria de futuro as mesas dos banquetes triunfais dos seus sucessores, atrelavam perto dela os lebréus: punham o concelho ao pé do castelo, do mosteiro e da catedral. Guimarães breve obteve do conde um foral, uma carta de município, tudo pro bono pacis, como reza o respectivo documento.

<< Página Anterior

pág. 10 (Capítulo 2)

Página Seguinte >>

Capa do livro O Bobo
Páginas: 191
Página atual: 10

 
   
 
   
Os capítulos deste livro:
I - Introdução 1
II - Dom Bibas 8
III - O Sarau 18
IV - Receios e esperanças 27
V - A madrugada 38
VI - Como de um homenzinho se faz um homenzarão 45
VII - O homem do zorame 59
VIII - Reconciliação 66
IX - O desafio 80
X - Generosidade 90
XI - O subterrãneo 97
XII - A mensagem 110
XIII - A boa corda de cânave de quatro ramais 123
XIV - Amor e vingança 141
XV - Conclusão 157
Apêndice 173