O Bobo - Cap. 13: XIII - A boa corda de cânave de quatro ramais Pág. 131 / 191

Chegou a desconfiar da rainha e do alferes-mor: e estas desconfianças eram um tormento infernal. Traído por eles, quem lhe restava? Se ao menos pudesse dizer-lho, pedir-lhes provas da sua lealdade! Era uma ideia insensata. Refugiu dela com horror. A própria imaginação se lhe convertera em verdugo implacável, e a alma dura e orgulhosa do filho de Pedro Froilaz debatia-se no meio dos seus receios, como se em longo pesadelo visse surgir ao redor de si todos aqueles a quem o prendiam mais estreitos laços convertidos por feitiçaria diabólica em disfarçados mas implacáveis inimigos. Estas dúvidas terríveis se modificaram, porém, com a lembrança das probabilidades que tinha de triunfar do infante. Depois da vitória ele obteria facilmente do imperador Afonso de Leão os condados de Portugal e Coimbra como feudos reais, e então, arrancando a máscara de um amor que expiara, usaria como senhor do poder que muitas vezes se via constrangido a deixar vacilante nas fracas mãos da infanta-rainha.

No meio de semelhantes reflexões o conde não se esquecera do mensageiro cativo. No seu ódio contra a família de Riba de Douro, ódio que naquele momento parecia acumular-se todo sobre a cabeça do desgraçado mancebo, não lhe bastava assassiná-lo: era preciso ajuntar à morte a ignomínia; por isso o condenava ao suplício dos peões e servos. O cadáver de Egas, pendurado dos muros do castelo, seria uma prova terrível de que entre o infante e a rainha estava o senhor de Trava; e que a significação deste nome era a de uma guerra de extermínio.

Na série dos pensamentos que em turbilhões passavam pelo espírito de Fernando Peres, surgiu um, tenebroso e maldito, que fez sorrir o perverso. Era um oásis em que a sua alma, correndo despeada por deserto ardente de temores, incertezas e agonias, se reclinava para repousar voluptuosamente. O momento de entregar Dulce nos braços de Garcia Bermudes tinha, finalmente, chegado.





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