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Capítulo 13: XIII - A boa corda de cânave de quatro ramais

Página 132

Quando Egas entrou na sala do conselho, onde já o alferes- -mor se achava, o conde se confirmara até certo ponto nas suas suspeitas: lera no gesto de um e de outro que eram de feito rivais. A ideia de prender a si o esforçado aragonês, fazendo-lhe obter a mão de Dulce, já não era o principal motivo que obrigava Fernando Peres a ocupar-se de alheios amores no meio dos sérios cuidados que o cercavam. Havia nisso mais graves razões. Cumpria- lhe vencer a resistência de uma herdeira ilustre, e fazer calar a repugnância da rainha diante da sua forte vontade. Naquela época um dos privilégios mais importantes, introduzido na Espanha pela influência feudal dos costumes francos, tendentes a aumentar o poderio dos príncipes e barões, era o direito de escolher marido para as órfãs nobres, filhas de feudatários dos seus estados ou senhorios. Este direito, conhecido na França pelo nome de maritágio, estabelecido depois entre nós debaixo da denominação de cartas de casamento, vigorou, estendendo-se às mesmas órfãs plebeias, pelo menos até ao século XIII, posto que fortemente combatido pelas cortes ou parlamentos. Fernando Peres considerava- se já como senhor dos condados de Portugal e Coimbra, e por isso devia impedir aquele exemplo de resistência contra um dos direitos de maior valia nos novos costumes feudais, ao passo que lhe importava obrigar a rainha a ceder do próprio alvedrio num dos afectos mais profundos do seu coração, o amor que tinha a Dulce, a sua filha adoptiva.

A estas considerações se ajuntava um prazer mesquinhamente ferino; e por isso no rosto do conde deslizara sorriso atroz. Se Egas amava Dulce, ele podia acrescentar-lhe na morte mais um martírio: se Dulce amava o mancebo, ela própria seria o instrumento desse martírio, crendo salvar o seu amante. Era um desígnio bárbaro o que o senhor de Trava formara; mas por isso mesmo deleitoso para aquela alma repassada de maldade e de fel.

Havendo saboreado por algum tempo a requintada vingança que traçara contra o nobre cavaleiro, que, provocado por uma acção brutal, tão duramente o afrontara, o conde de Trava passeou durante algum tempo de um para outro lado procurando recobrar aparente tranquilidade.

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pág. 132 (Capítulo 13)

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Capa do livro O Bobo
Páginas: 191
Página atual: 132

 
   
 
   
Os capítulos deste livro:
I - Introdução 1
II - Dom Bibas 8
III - O Sarau 18
IV - Receios e esperanças 27
V - A madrugada 38
VI - Como de um homenzinho se faz um homenzarão 45
VII - O homem do zorame 59
VIII - Reconciliação 66
IX - O desafio 80
X - Generosidade 90
XI - O subterrãneo 97
XII - A mensagem 110
XIII - A boa corda de cânave de quatro ramais 123
XIV - Amor e vingança 141
XV - Conclusão 157
Apêndice 173