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Capítulo 4: IV - Receios e esperanças

Página 28

– Sei-o eu! – replicou este com gesto de sobrecenho e de autoridade. – Ouvi-as do escudeiro que as trouxe – acrescentou com sorriso de mistério – disse-mo quem tão bem como ele o sabia, e acerca disso me perguntava: «Pois que faremos, D. Eicha?» É lástima: é na verdade lástima! Não me sofre o ânimo ver assim um moço ambicioso e louco desacatar com armas rebeldes sua mãe, sua senhora. Largo campo à cobiça de honra e domínios, se pretende ganhar nome e poder, se lhe abre em terras de infiéis. Se tem sede de sangue, derrame o sangue dos malditos ismaelitas, moabitas e agarenos. Os campos do Sul aí estão patentes à ambição dos ousados. Que vão devastar as searas dos Mouros, derribar as suas povoações e castelos, incendiar-lhes as mesquitas, onde diariamente se repetem as blasfémias, torpezas e imundícies do abominável Alcorão. Deus há-de puni-lo: o castigo é infalível, mas para isso a espada cristã encontrar-se-á no ar com a espada cristã, e a lança romperá a cervilheira assinalada com a cruz de Jesus Cristo.

O honrado cónego invectivava assim, todas as vezes que lhe caía a talho, contra os sectários de Mafamede, porque os conhecia de perto.

– Mas – acudiu o abade – se o infante traz esse número de cavaleiros e besteiros; se o mui poderoso arcebispo de Braga o favorece tão claramente; se os burgueses da Sé do Porto e os de Coimbra começam a agitar-se, como deixará a rainha de vir a concórdia com seu filho?

– É impossível – interrompeu Martim Eicha. – Ele pretende que o ilustre conde de Trava lhe entregue as honras e préstamos que tem da munificência real, e que saia destes paços. Não contente com isso, pretende também que sua mãe lhe ceda o supremo poder: invoca o exemplo de Afonso Raimundes e o direito de suceder a seu pai, sem se lembrar que jamais Henrique de Borgonha cingiria a coroa de conde se não houvera sido o esposo de uma filha de Afonso o Grande. Que herdou de feito o infante de seu pai? Um nome glorioso; mais nada. Portugal não é herança dos duques de Borgonha, mas dos filhos dos reis da Espanha, e D. Teresa é filha do último deles.

O Lidador sentiu subir-lhe às faces o rubor da cólera ao ouvir estas palavras.

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Capa do livro O Bobo
Páginas: 191
Página atual: 28

 
   
 
   
Os capítulos deste livro:
I - Introdução 1
II - Dom Bibas 8
III - O Sarau 18
IV - Receios e esperanças 27
V - A madrugada 38
VI - Como de um homenzinho se faz um homenzarão 45
VII - O homem do zorame 59
VIII - Reconciliação 66
IX - O desafio 80
X - Generosidade 90
XI - O subterrãneo 97
XII - A mensagem 110
XIII - A boa corda de cânave de quatro ramais 123
XIV - Amor e vingança 141
XV - Conclusão 157
Apêndice 173