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Capítulo 4: IV - Receios e esperanças

Página 35

Apenas um  cavaleiro com os braços cruzados e encostado a uma das colunas imediatas ao estrado das donzelas, imóvel, e com os olhos cravados na colgadura da porta por onde D. Teresa saíra, parecia entregue a profunda meditação. Uma voz veio tirá-lo daquele torpor: era a de Dom Bibas, que, repotreado na cadeira da rainha, olhava para ele fito, e lhe salmeava em tom soturno, pela solfa do canto gregoriano, bastas injúrias:

Fora, parvo aragonês.
Dom bulrão.
Tlão, tlão, tlão!
Vai tratar de teus amores
No Aragão.
Tlão, tlão, tlão!
As donzelas portuguesas
Lindas são.
Tlão, tlão, tlão!
E por isso haver quer uma
Dom bulrão.
Tlão, tlão, tlão!
A Dulce é bela donzela;
Mas flor d’aleli
Não é para ti.
Kirieleison.
Kirieleison.
Requiem ceternam dona eis
Et lux luceat eis.

O cavaleiro pôs-se a ouvi-lo sorrindo; mas aqueles derradeiros fragmentos das preces pelos extintos, entoados lugubremente e reboando no aposento sonoro, assemelhavam-se-lhe aos ecos das orações por finado repercutidas por abóbada de igreja em trintário cerrado. Sentiu correr-lhe os membros um calefrio – não de temor, porque não o conhecia o seu coração; mas de terror – desse religioso terror que na crédula Idade Média, às vezes, e por mil motivos vãos, vergava os ânimos mais esforçados. Era singular o efeito que nele produzia a voz roufenha de Dom Bibas; mas é certo que essa voz despertava na sua alma lembranças de morte e uma indizível tristeza.

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Capa do livro O Bobo
Páginas: 191
Página atual: 35

 
   
 
   
Os capítulos deste livro:
I - Introdução 1
II - Dom Bibas 8
III - O Sarau 18
IV - Receios e esperanças 27
V - A madrugada 38
VI - Como de um homenzinho se faz um homenzarão 45
VII - O homem do zorame 59
VIII - Reconciliação 66
IX - O desafio 80
X - Generosidade 90
XI - O subterrãneo 97
XII - A mensagem 110
XIII - A boa corda de cânave de quatro ramais 123
XIV - Amor e vingança 141
XV - Conclusão 157
Apêndice 173