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Capítulo 8: VIII - Reconciliação

Página 68

Proferidas estas palavras, Egas desapareceu numa escada de caracol aberta no fundo da torre, e que dizia para o primeiro pavimento dela. Chegado ao alto tirou do seio uma chave e abriu uma porta, não a que dava para a quadra principal da torre, mas outra lateral e pequena. Cruzou o passadiço, e num momento achou-se no jardim pênsil.

Naquele lugar e hora, as paixões tumultuosas que lhe agitavam o espírito o obrigaram a reflectir alguns momentos, e a procurar restabelecer no seu coração a possível tranquilidade. Que pretendia? A que vinha ali como um salteador nocturno? Ele mesmo não o sabia ao certo. Era apenas uma vaga esperança de ainda ver Dulce, de lhe exprobrar a sua leviandade, de lhe dizer tudo quanto o ciúme e a desesperação lhe ensinassem. Desde que a fama dos amores da donzela com Garcia Bermudes chegara aos seus ouvidos, não houvera para ele repousar um instante. Buscando qualquer pretexto plausível para se dirigir a Guimarães, logo que chegara ao arraial do infante se oferecera para indagar da própria boca de Gonçalo Mendes qual seria a sua resolução final na luta que se ia travar. Vestindo os trajos de vilão – o arbim e o zorame de burel – entrara no burgo ao romper de alva, e dirigindo-se à mouraria perguntara por Abul-Hassan. Entre os mouros que, ao tirar a grossa cadeia de ferro lançada de noite à entrada do seu bairro, saíam de golpe para os trabalhos rurais, divisou brevemente aquele que buscava. Deu-se-lhe a conhecer, e antes que a alegria que o mouro mostrou ao vê-lo se revelasse por sinais que gerassem desconfianças, pediu-lhe o guiasse à sua pousada. Aí, entregando-lhe uma bolsa de couro com alguns almorabitinos, disse-lhe:

– Far-me-ás tu, Abul-Hassan, ainda uma vez o serviço que tantas te devi antes de partir para o ultramar?

– Posto que o ódio contra os meus irmãos – respondeu sorrindo o árabe – vos levasse tão longe para lhes derramar o sangue, como se vos não bastasse o dos muslins da Espanha, nem por isso vos perdi a afeição, porque sei por experiência que ao menos não seríeis cruel para com os vencidos, como são quase todos os guerreiros cristãos. O serviço de que me falais, sem que mo dissésseis, já eu o adivinhei. A chave da porta secreta da torre do miradouro ainda está em meu poder, porque ainda me não tiraram o cargo do jardim da rainha. À hora da quinta oração podeis vir buscá-la aqui.

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Capa do livro O Bobo
Páginas: 191
Página atual: 68

 
   
 
   
Os capítulos deste livro:
I - Introdução 1
II - Dom Bibas 8
III - O Sarau 18
IV - Receios e esperanças 27
V - A madrugada 38
VI - Como de um homenzinho se faz um homenzarão 45
VII - O homem do zorame 59
VIII - Reconciliação 66
IX - O desafio 80
X - Generosidade 90
XI - O subterrãneo 97
XII - A mensagem 110
XIII - A boa corda de cânave de quatro ramais 123
XIV - Amor e vingança 141
XV - Conclusão 157
Apêndice 173