Todas as noites Amélia, ao ouvir tocar a campainha, tinha uma palpitação tão forte no coração que ficava como sufocada um momento. Depois os botins de João Eduardo rangiam na escada, ou ela conhecia os passos fofos das galochas das Gansosos: apoiava-se então às costas da cadeira, cerrando os olhos, como na fadiga duma desesperança repetida. Esperava o padre Amaro; e às vezes, pelas dez horas, quando já não era possível que ele viesse, a sua melancolia era tão pungente que se lhe intumescia a garganta de soluços, tinha de pousar a costura, dizer:
- Vou-me deitar, estou com umas dores de cabeça que não paro!
Atirava-se para a cama de bruços, murmurava numa agonia:
- Oh Senhora das Dores, minha madrinha! Por que não vem ele, por que não vem ele?
Nos primeiros dias, apenas ele se fora embora, toda a casa lhe pareceu desabitada e lúgubre! Quando vira no quarto dele os cabides sem a sua roupa, a cômoda sem os seus livros, rompeu a chorar. Foi beijar a travesseirinha onde ele dormia, apertou ao peito com delírio a última toalha a que ele limpara as mãos! Tinha constantemente o seu rosto presente, ele entrara sempre nos seus sonhos. E com a separação o seu amor ardia mais forte e mais alto, como uma fogueira que se isola.
Uma tarde, que fora visitar uma prima enfermeira no hospital, viu ao chegar à Ponte gente parada, embasbacada com gozo para uma rapariga de cuia à banda e garibaldi escarlate, que, de punho no ar, já rouca, praguejava contra um soldado: o rapazola, um beirão de cara redonda e lorpa coberta de penugem loura, virava-lhe as costas, encolhendo os ombros, as mãos muito enterradas nos bolsos, rosnando:
- Não lhe fez mal, não lhe fez mal...