O Crime do Padre Amaro - Cap. 14: Capítulo 14 Pág. 258 / 478

Vejam que maçada tem sido esta aqui, todo o dia! A repartição fecha-se às três!

E sua excelência, rodando, sobre os tacões, foi debruçar-se à sacada do seu gabinete - àquela sacada de onde ele diariamente, das onze às três, retorcendo o bigode louro e entesando o plastrão azul, depravava a mulher do Teles.

O Carlos abria já o batente verde, quanto um pst do Domingos o deteve.

- Ó amigo Carlos .- e o sorrisinho do escrivão tinha uma suplicação tocante - desculpe, hem? Mas... Traz-me de lá uma caixita de fósforos?

Neste momento à porta aparecia o padre Amaro; e por trás a massa enorme do Silvério.

- Eu desejava falar ao senhor administrador em particular, disse Amaro.

Todos os empregados se ergueram; João Eduardo também, branco como a cal do muro. O pároco, com as sua passadas sutis de eclesiástico, atravessou a repartição, seguido do bom Silvério que ao passar diante do escrevente descreveu de esguelha um semicírculo cauteloso, com terror ao réu; o senhor administrador acudira a receber suas senhorias; e a porta do gabinete fechou-se discretamente.

- Temos composição, rosnou o experiente Domingos, piscando o olho aos colegas.

O Carlos sentara-se descontente. Viera ali para esclarecer a autoridade sobre os perigos sociais que ameaçavam Leiria, o Distrito e a Sociedade, para ter o seu papel naquele processo, que, segundo ele, era um processo político - e ali estava calado, esquecido, no mesmo banco ao lado do réu! Nem lhe tinham oferecido uma cadeira! Seria realmente intolerável que as coisas se arranjassem entre o pároco e o administrador sem o consultarem a ele! Ele, o único que percebera naquele murro dado no ombro do padre - não o punho do escrevente, mas a mão do Racionalismo! Aquele desdém pelas suas luzes parecia-lhe um erro funesto da administração do Estado.





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