E distinguia-os (segundo os preceitos do ritual que o confessor lhe explicava), dando-lhes uma devoção graduada, e não tendo por S. José de segunda classe o respeito que sentia por S. José de primeira classe. Aquela riqueza era a inveja das amigas, a edificação dos curiosos, e fazia sempre dizer ao Libaninho quando a vinha visitar, abrangendo a sala num olhar langoroso: - Ai, filha, é o reininho dos Céus!
- Não é verdade, continuava a excelente senhora radiante, que ele aqui é que estava bem, o santinho do pároco? É como ter o Céu debaixo da mão!
As duas senhoras concordaram. Ela podia ter a sua casa arranjada com devoção, ela que era rica...
- Não o nego, tenho aqui empregadinhos alguns centos de mil-réis. Sem contar o que está no relicário...
Ah, o famoso relicário de sândalo forrado de cetim! Tinha lá uma lascazinha da verdadeira Cruz, um bocado quebrado do espinho da Coroa, um farrapinho do cueiro do Menino Jesus. E murmurava-se com azedume, entre as devotas, que coisas tão preciosas, de origem divina, deviam estar no sacrário da Sé. D. Maria da Assunção temendo que o senhor chantre soubesse daquele tesouro seráfico, só o mostrava às íntimas, misteriosamente. E o santo sacerdote, Que lho obtivera, fizera-a jurar sobre o Evangelho de não revelar a procedência "para evitar falatórios".
A S. Joaneira, como sempre, admirou sobretudo o farrapinho do cueiro.
- Que relíquia, que relíquia! murmurava.
E D. Maria da Assunção muito baixo:
- Não há melhor. Trinta mil-réis me custou... Mas dava sessenta, mas dava cem! mas dava tudo! - E babando-se toda, diante do trapinho precioso: - O cueirinho! dizia Quase a chorar. Meu rico Menino, o seu cueirinho...