O Crime do Padre Amaro - Cap. 18: Capítulo 18 Pág. 327 / 478

Mas, enfim, fiel à sua promessa, daí a dias, na manhã em que fora prevenido que Amélia ia à Totó, arrastou-se contrariado para a botica do Carlos; e instalou- se, com um olho no Popular e outro na porta, à espera que a rapariga atravessasse para a Sé. O amigo Carlos estava ausente; o Sr. Augusto ocupava os seus vagares sentado à escrivaninha, de testa sobre o punho, relendo o seu Soares de Passos; fora, o sol já quente dos fins de abril fazia rebrilhar o lajeado do largo; não passava ninguém; e só quebravam o silêncio as marteladas nas obras do doutor Pereira. Amélia tardava. E o cônego, depois de ter considerado longo tempo, com o Popular caído nos joelhos, o medonho sacrifício que fazia pela sua velhota, ia cerrando as pálpebras, já tomado da quebreira, naquele repouso calado do meio-dia próximo - quando entrou na botica um eclesiástico.

- Oh, abade Ferrão, você pela cidade! exclamou o cônego Dias despertando do seu quebranto.

- De fugida, colega, de fugida, disse o outro colocando cuidadosamente sobre uma cadeira dois grossos volumes que trazia, amarrados num barbante.

Depois voltou-se e tirou, com respeito, o seu chapéu ao praticante.

Tinha o cabelo todo branco; devia passar já dos sessenta anos; mas era robusto, uma alegria bailava sempre nos seus olhinhos vivos, e tinha dentes magníficos a que uma saúde de granito conservava o esmalte; o que o desfigurava era um nariz enorme.

Informou-se logo com bondade se o amigo Dias estava ali de visita ou infelizmente por motivo de doença.

- Não, estou aqui à espera. Uma embaixada de truz, amigo Ferrão!

- Ah, fez o velho discretamente. - E enquanto tirava com método duma carteira atulhada de papéis a receita para o praticante, deu ao cônego notícias da freguesia. Era lá, nos Poiais, que o cônego tinha a fazenda, a Ricoça. O abade Ferrão passara de manhã diante da casa e ficara surpreendido vendo que lhe andavam a pintar a fachada.





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