O Crime do Padre Amaro - Cap. 18: Capítulo 18 Pág. 332 / 478

Ergueu-se por fim, soprou como numa calma de agosto, sorveu de espaço uma pitada forte; e ficou com a caixa aberta entre os dedos, os olhos muito vermelhos cravados na colcha da Totó.

- Então, senhor cônego, que lhe parece cá a minha doente? perguntou Amélia.

Ele respondeu, sem a olhar:

- Sim senhor, muito bem... Vai bem... É esquisita... Pois é andar, é andar... Adeus...

Saiu, resmungando que tinha negócios, - e voltou imediatamente à botica.

- Um copo de água! exclamou, caindo em cheio sobre a cadeira.

O Carlos, que voltara, apressou-se, oferecendo flor de laranja, perguntando se sua excelência estava incomodado...

- Cansadote, disse.

Tomou o Popular de sobre a mesa, e ali ficou, sem se mexer, abismado nas colunas do periódico. O Carlos tentou falar da política do pais, depois dos negócios de Espanha, depois dos perigos revolucionários que ameaçavam a Sociedade, depois da deficiência da administração do concelho de que era agora um adversário feroz... Debalde. Sua excelência grunhia apenas monossílabos soturnos. E o Carlos, enfim, recolheu-se a um silêncio chocado, comparando, num desdém interior que lhe vincava de sarcasmo os cantos dos beiços, a obtusidade soturna daquele sacerdote à palavra inspirada dum Lacordaire e dum Malhão! Por isso o Materialismo em Leiria, em todo o Portugal, erguia a sua cabeça de hidra...

Batia uma hora na torre quando o cônego, que vigiava a Praça pelo canto do olho, vendo passar Amélia, arremessou o jornal, saiu da botica sem dizer uma palavra e estugou o seu passo de obeso para a casa do tio Esguelhas. A Totó estremeceu de medo ao ver de novo aquela figura bojuda aparecer à porta da alcova. Mas o cônego riu-se para ela, chamou-lhe Totozinha, prometeu-lhe um pinto para bolos; e mesmo sentou-se aos pés da cama com um ah! regalado, dizendo:





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