- Tudo passa, disse o cónego. E depois de uma pausa: - Ah! Mas Leiria já não é Leiria!
Passearam então um momento em silêncio, numa recordação que lhes vinha do passado, os quinos divertidos da S. Joaneira, as palestras ao chá, as passeatas ao Morenal, o Adeus e o Descrido cantados pelo Artur Couceiro e acompanhados pela pobre Amélia que, agora, lá dormia no cemitério dos Poiais, sob as flores silvestres...
- E que me diz você a estas coisas da França, Amaro? - exclamou de repente o cónego.
- Um horror, padre-mestre... O arcebispo, uma súcia de padres fuzilados!... Que brincadeira!
- Má brincadeira, rosnou o cónego.
E o padre Amaro:
- E cá pelo nosso canto parece que começam também essas ideias...
O cónego assim o ouvira. Então indignaram-se contra essa turba de mações, de republicanos, de socialistas, gente que quer a destruição de tudo o que é respeitável - o clero, a instrução religiosa, a família, o exército e a riqueza... Ah! a sociedade estava ameaçada por monstros desencadeados! Eram necessárias as antigas repressões, a masmorra e a forca. Sobretudo inspirar aos homens a fé e o respeito pelo sacerdote.
- Aí é que está o mal, disse Amaro, é que nos não respeitam! Não fazem senão desacreditar-nos... Destroem no povo a veneração pelo sacerdócio...
- Caluniam-nos infamemente, disse num tom profundo o cónego.
Então junto deles passaram duas senhoras, uma já de cabelos brancos, o ar muito nobre; a outra, uma criaturinha delgada e pálida, de olheiras batidas, os cotovelos agudos colados a uma cinta de esterilidade, pouff enorme no vestido, cuia forte, tacões de palmo.
- Cáspite! disse o cónego baixo, tocando o cotovelo do colega. Hem, seu padre Amaro?... Aquilo é que você queria confessar.