O Primo Basílio - Cap. 9: CAPÍTULO IX Pág. 259 / 414

A outra voltou-se, surpreendida.

E Luísa batendo com as mãos, num movimento suplicante:

- Mas você ao menos nestes primeiros dias... Eu hei de arranjar, esteja cena!...

Juliana acudiu logo:

- Oh, minha senhora! Eu não quero dar desgostos a ninguém. O que eu quero é um bocadinho de pão para a velhice. De minha boca não há de vir mal a ninguém. O que peço à senhora é que se for da sua vontade e me quiser ir ajudando...

- Lá isso, sim... O que você quiser..

- Pois pode, estar certa que esta boca... - E fechou os lábios com os dedos.

Que alegria para Luísa! Tinha uns dias, umas semanas, enfim, sem tormentos, com o seu Jorge! Abandonou-se então toda à deliciosa impaciência de o ver. Era singular - mas parecia-lhe que o amava mais!... - E depois pensaria, veria, daria outros presentes a Juliana, poderia pouco a pouco preparar Sebastião... Quase se sentia feliz.

De tarde Juliana veio dizer-lhe, muito risonha:

- A Sra. Joana saiu, que era hoje o seu dia, mas eu tinha tanta precisão de sair, também! Se a senhora lhe não custasse ficar só...

- Não! Fico, que tem? Vá, vá!

E, dai a pouco, sentiu-a bater os tacões no corredor, fechar com ruído a cancela.

Então de repente uma idéia deslumbrou-a, como a fulguração de um relâmpago: - ir ao quarto dela, rebuscar-lhe a arca, roubar-lhe as cartas!

Viu-a da janela dobrar a esquina. Subiu logo ao sótão, devagar, escutando, com o coração aos saltos. A porta do quarto de Juliana estava aberta; vinha de lá um cheiro de mofo, de rato e de roupa enxovalhada que a enjoou; pelo postigo entrava uma luz triste, de tarde escura; e por baixo, encostada à parede, ficava a arca! Mas estava fechada! Decerto! Desceu correndo, veio buscar o seu molho de chaves... Sentiu uma vergonha - mas se achasse as cartas! Aquela esperança deu-lhe todos os atrevimentos, como um vinho alcoólico.





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