- O de óculos?
- O de óculos.
Luísa fez-se muito corada:
- Oh, Leopoldina! - murmurou. E depois de um silêncio, rapidamente.
- Quem to disse?
- Sei-o eu. Disse-o ele ao Mendonça. Sabes que eram unha e carne. Que te dava tudo o que tu lhe pedisses! Disse-lho mais de uma vez.
- Que horror! - exclamou Luísa subitamente indignada. - E tu propões me semelhante coisa? - O seu olhar, sob as sobrancelhas franzidas, dardejava de cólera. Ir com um homem por dinheiro! - Tirou o chapéu, violentamente, com as mãos trémulas; arremessou-o para a jardineira, e com passos rápidos pelo quarto: - Antes fugir, ir para um convento, ser criada, apanhar a lama das ruas!
- Não te exaltes, criatura! Quem te diz isso? Talvez o homem te emprestasse' o dinheiro, desinteressadamente...
- Acreditas tu?
Leopoldina não respondeu: com a cabeça baixa, fazia girar os anéis nos dedos.
- E quando fosse outra coisa? - exclamou de repente. - Era um conto de réis, eram dois, estavas salva, estavas feliz!
Luísa sacudiu os ombros, indignada daquelas palavras - dos seus próprios pensamentos, talvez!
- É indecente! É horrível! - dizia.
Ficaram caladas.
- Ah! fosse eu!... - disse Leopoldina.
- Que fazias?
- Escrevia ao Castro, que viesse e com dinheiro!
- Isso és tu! - exclamou Luísa, arrebatadamente.
Leopoldina fez-se escarlate sob a camada de pó-de-arroz.
Mas Luísa atirou-lhe os braços ao pescoço:
- Perdoa-me, perdoa-me! Estou doida, não sei o que digo!...
Começaram ambas a chorar, muito nervosas.
Tu zangaste-te! - dizia Leopoldina cortada de soluços. - Mas é pra teu bem. É o que me parece melhor. Se eu pudesse dava-te o dinheiro... Fazia tudo. Acredita!
E abrindo os braços, indicando o seu corpo com um impudor sublime:
- Seiscentos mil réis! Se eu valesse tanto dinheiro, tinha-o amanhã!
Nós de dedos bateram à porta.