O Primo Basílio - Cap. 11: CAPÍTULO XI Pág. 299 / 414

Não é verdade, meu Jorge?

Mas o Saavedra interrompeu ruidosamente, com a face acesa numa jovialidade libertina:

- Eu, num quarto de dormir, as únicas pinturas que admito são uma bela ninfa nua, ou uma bacante desenfreada!

- Isso, isso! - bradou o Alves Coutinho. A boca dilatava-lhe numa admiração sensual. - Este Saavedra! Este Saavedra! E baixo para Sebastião: - Tem um talento! Tem um talento!

O Conselheiro voltou-se para Julião, e puxando o guardanapo para o estômago:

- Espero que não sejam esses os painéis imorais que se vêem no seu gabinete de estudo...

Julião emendou:

- No meu cubículo. Ah! Não, Conselheiro! Tenho apenas duas litografias - uma é um homem sem pele para representar o sistema arterial, o outro é o mesmo indivíduo igualmente sem pele para se ver o sistema nervoso.

O Conselheiro teve com a sua mão branca um vago gesto enojado, e exprimiu a opinião - que na Medicina, aliás uma grande ciência!, havia coisas bastante asquerosas. Assim, ouvira dizer que nos teatros anatômicos, os estudantes de idéias mais avançadas levavam o seu desprezo pela moral até atirarem uns aos outros, brincando, pedaços de membros humanos, pés, coxas, narizes...

- Mas é como quem mexe em terra, Conselheiro! - disse Julião, enchendo o copo. - É matéria inerte!

- E a alma, Sr. Zuzarte? - exclamou o Conselheiro. Fez um gesto de vaga reticência; e julgando tê-lo aniquilado com aquela palavra suprema, abriu para Sebastião um sorriso cortês e protetor: - E que diz o nosso bondoso Sebastião?

- Estou a ouvir, Sr. Conselheiro.

- Não dê ouvidos a estas doutrinas! - Com o garfo mostrava a figura biliosa de Julião. - Mantenha a sua alma pura. São perniciosas. Que o nosso Jorge (o que é de lamentar num homem estabelecido e empregado do Estado) também vai um pouco para estas exagerações materialistas!

Jorge riu; afirmou que sim, que tinha essa honra.





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