Juliana, sentada à beira da cadeira, apertando desesperadamente as mãos, rosnava por entre os dentes cerrados:
- A bêbeda! A bêbeda!
Sebastião, impaciente, pôs a mão no fecho da porta.
- Espere, seu diabo! - gritou ela erguendo-se com um salto. Fixou-o rancorosamente, desabotoou o corpete, enterrou a mão no peito, tirou uma carteirinha. Mas de repente batendo com o pé, num frenesi:
- Não! Não! Não!
- Diabos me levem se você não for dormir à enxovia! - Entreabriu a porta. - Ó Sr. Mendes!
- Aí tem! - gritou ela atirando-lhe a carteira. E brandindo para ele os punhos: - Raios te partam, malvado!
Sebastião apanhou a carteira. Havia três cartas: uma muito dobrada era de Luísa; leu a primeira linha: "Meu adorado Basílio"; e muito pálido guardou logo tudo na algibeira interior do casaco. Abriu então a porta: a possante figura do Mendes estava na sombra.
- Está tudo arranjado, Sr. Mendes - a voz tremia-lhe um pouco -, não lhe quero tomar mais tempo.
O homem fez uma continência, calado; quando Sebastião, no patamar, lhe resvalou na mão uma libra, o Mendes curvou-se respeitosamente e disse, com uma voz pegajosa:
- E para o que quiser, o sessenta e quatro, o Mendes, que foi da Guarda. Não se incomode Vossa Senhoria. Às ordens de Vossa Senhoria minha mulher e filhos agradecem. Não se incomode Vossa Senhoria. O sessenta e quatro, O Mendes, que foi da Guarda!
Sebastião fechou a cancela, voltou à sala de jantar. Juliana ficara numa cadeira, aniquilada; mas apenas o viu, erguendo-se furiosamente:
- A bêbeda foi-lhe contar tudo! Foi você que arranjou a armadilha! Também você dormiu com ela!...
Sebastião, muito branco, dominava-se.
- Vá pôr o chapéu, mulher. O Sr. Jorge despediu-a. Amanhã mandará buscar os baús.