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O Dr. Caminha, com o beiço descaído, oscilava incredulamente a cabeça:
- Teorias! - murmurou.
- Nos hospitais ingleses... - começou Julião.
O Dr. Caminha encolheu os ombros com desprezo.
- Mas se o doutor lesse... - insistiu Julião.
- Não leio nada! - disse o Dr. Caminha com força - tenho lido demais! Os livros são os doentes... - E curvando-se, com ironia: - Mas se o meu talentoso colega quer fazer a experiência...
- Um copo de conhaque ou de aguardente! - pediu Julião à porta.
E o Dr. Caminha sentou-se comodamente "para gozar o fracasso do talentoso colega".
Levantaram Luísa; Julião fez-lhe engolir o conhaque; quando a deitaram ficou na mesma imobilidade comatosa; o Dr. Caminha tirou o relógio, viu as horas, esperou; havia um silêncio ansioso; enfim o doutor ergueu-se, tomou-lhe o pulso, apalpou a frialdade crescente das extremidades; e indo buscar silenciosamente o chapéu começou a calçar as luvas.
Jorge foi com ele até à porta:
- Então, doutor? - disse, agarrando-lhe com uma força desvairada o braço.
- Fez-se o que se pôde - disse o velho, encolhendo os ombros.
Jorge ficou estúpido no patamar, vendo-o descer. As suas passadas vagarosas nos degraus caíam-lhe com uma percussão medonha no coração. Debruçou-se no corrimão, chamou-o baixo. O doutor parou, levantou os olhos; Jorge pôs as mãos para ele, com uma ansiedade humilde:
- Então não é possível mais nada?
O doutor fez um gesto vago, indicou o céu.
Jorge voltou para o quarto, encostando-se às paredes. Entrou na alcova, atirou-se de joelhos aos pés da cama, e ali ficou com a cabeça entre as mãos num soluçar baixo e continuo.
Luísa morria: os seus braços tão bonitos, que ela costumava acariciar diante do espelho, estavam já paralisados; os seus olhos, a que a paixão dera chamas e a voluptuosidade lágrimas, embaciavam-se como sob a camada ligeira de uma pulverização muito fina.