A carapinha do preto, essa, em lugar de risca tinha um sulco cavado à tesoura na massa de lã espessa. Quem seriam, por que estavam ali, aqueles africanos de perfil trombudo?
- Tu já reparaste nesta extraordinária carapinha, Cruges?
O outro, que se não mexera da sua atitude de estátua tumular, grunhiu da sombra um monossílabo surdo.
Carlos respeitou-lhe os nervos.
De repente, ao desafinar mais áspero de um coro, Cruges deu um salto.
- Isto só a pontapé... Que empresa esta! rugiu ele, envergando furiosamente o paletó.
Carlos foi levá-lo no coupé à rua das Flores, onde ele morava com a mãe e uma irmã; e até ao Ramalhete não cessou de lamentar consigo o seu serão de estudo perdido.
O criado de Carlos, o Baptista, (familiarmente, o Tista) esperava-o, lendo o jornal, na confortável antecâmara dos «quartos do menino», forrada de veludo cor de cereja, ornada de retratos de cavalos e panóplias de velhas armas, com divãs do mesmo veludo, e muito alumiada a essa hora por dois candeeiros de globo pousados sobre colunas de carvalho, onde se enrolavam lavores de ramos de vide.
Carlos tinha desde os onze anos este criado de quarto, que viera com o Brown para Sta. Olávia, depois de ter servido em Lisboa, na Legação inglesa, e ter acompanhado o ministro, sir Hércules Morrisson, varias vezes a Londres. Foi em Coimbra, nos Paços de Celas, que Baptista começou a ser um personagem: Afonso correspondia-se com ele de Sta. Olávia. Depois viajou com Carlos; enjoaram nos mesmos paquetes, partilharam dos mesmos sandwichs no bufete das gares; Tista tornou-se um confidente. Era hoje um homem de cinquenta anos, desempenado, robusto, com um colar de barba grisalha por baixo do queixo, e o ar excessivamente gentleman. Na rua, muito direito na sua sobrecasaca, com o par de luvas amarelas espetado na mão, a sua bengala de cana da Índia, os sapatos bem envernizados, tinha a considerável aparência de um alto funcionário.