Os criados dele nunca a tinham visto, não sabiam quem era a senhora que o visitava... Tantos cuidados, e tudo estragado!
- Estranho, estranho! murmurava Craft.
Houve um silêncio. A Sr.ª Adélia terminara por descansar familiarmente numa cadeira, com a sua trouxazinha no regaço.
- Pois olhe, Sr. Ega, disse ela, depois de reflectir, creia então uma coisa, é que foi em sonhos. Já tem acontecido... Foi a senhora que sonhou alto com v. ex.ª, disse tudo, o Sr. Cohen ouviu, ficou de pedra no sapato, espreitou-a, e descobriu a marosca... E eu sei que ela sonha alto.
Ega, diante da Sr.ª Adélia, percorria-a desde as flores do chapéu até à roda das saias, com os olhos faiscantes.
- Como é possível que ele ouvisse? Se eles tinham quartos separados!... Eu sei que tinham.
A Sr.ª Adélia baixou as pálpebras, acariciou com os dedos calçados de luvas pretas a sua trouxazinha redonda, e disse mais baixo estas palavras:
- Não tinham, não senhor. Nem a senhora consentia em tal arranjo... A senhora gosta muito do marido, e tem muitos ciúmes dele.
Houve um silêncio embaraçado e desagradável. Sobre o toucador o resto da vela acabava, com uma luz lúgubre. E Ega, que afectara sorrir, encolher os ombros, dava pelo quarto passos lentos e murchos, triturando o bigode com a mão tremula.
Então Carlos enojado, cansado daquele episódio que durava desde a véspera, e onde constantemente se remexera em lodo, declarou que era necessário findar! Eram oito horas, e ele queria jantar...
- Sim, vamos todos jantar, murmurou o Ega, com o ar confuso e embaçado.
De repente fez um sinal à Sr.ª Adélia, arrastou-a para a sala, fechou-se lá outra vez.
- Você não está farto disto, Craft? exclamou Carlos, desesperado.
- Não. Acho um estudo curioso.
Esperaram ainda dez minutos. Subitamente a vela extinguiu-se. Carlos, furioso, gritou pelo pajem. E o garoto entrava com um imundo candeeiro de petróleo - quando Ega, mais composto, voltou da sala. Tudo acabara, a Sr.ª Adélia partira.