- Entra o Cohen? perguntou ela, rindo.
- Entramos todos, Sr.ª D. Maria. Todos nós somos lodaçal...
Nesse momento, por traz do recinto, rompia, com um taran-tan-tan molengão de tambores e pratos, o hino da Carta, a que se misturou uma voz de oficial e o bater de coronhas. E, entre dourados de dragonas, El-rei apareceu na tribuna, sorrindo, de quinzena
de veludo, e chapéu branco. Aqui e além, raros sujeitos cumprimentaram, muito de leve: a senhora espanhola, essa, tomou o óculo do regaço de D. Maria, e de pé, muito descansadamente, pôs-se a examinar o rei. D. Maria achava ridícula a música, dando às corridas um ar de arraial... Além disso, que tolice, o hino, como num dia de parada!
- E este hino, então, que é medonho, dizia Carlos. A Sr.ª D. Maria não sabe a definição do Ega, e a sua teoria dos hinos?
Maravilhosa!
- Aquele Ega! dizia ela sorrindo, já encantada.
- O Ega diz que o hino é a definição pela música do carácter de um povo. Tal é o compasso do hino nacional, diz ele, tal é o movimento moral da nação. Agora veja a Sr.ª D. Maria os diferentes hinos, segundo o Ega. A Marselhesa avança com uma espada nua. O God save the queen adianta-se, arrastando um manto real...
- E o hino da Carta?
- O hino da Carta ginga, de rabona.
E D. Maria ria ainda, quando a espanhola, sentando-se e repousando-lhe tranquilamente o binóculo no regaço, murmurou:
- Tiene cara de buena persona.
- Quem, o rei? exclamaram a um tempo D. Maria e Carlos. Excelente!
No entanto uma sineta tocava, perdida no ar. E no quadro indicador subiram os números dos dois cavalos que corriam o primeiro prémio dos Produtos. Eram o n.º1 e o n.º 4. D. Maria Teles quis-lhe saber os nomes, com o apetite de apostar e ganhar cinco tostões a Carlos. E como Carlos se erguia para arranjar um programa:
- Deixe estar o menino, disse ela, tocando-lhe no braço. Aí vem o nosso Alencar, com o programa... Olhe para aquilo! Veja se ainda hoje os há por aí com aquele ar de sentimento e de poesia...